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sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Tempo dos ipês (Ronaldo Monte)




Existe um tempo dos relógios e dos calendários, uma espécie de utensílio criado pelo homem para fixar e controlar essa coisa inefável que escorrer entre os dois pontos incógnitos de sua existência. Mas existe outro tempo que o homem contempla. É o tempo do mundo, do sol e da lua, do estio e da chuva, do verde e do cinza, do quente e do frio. Dentro deste tempo, o homem se encontra como coisa entre coisas. Seu poder é nulo. Resta-lhe apenas submeter-se ao círculo das repetições, até que ele mesmo um dia não retorne. Outros retornarão.

É dentro deste tempo fora dos relógios que se repete, todo fim de ano, no coração da capital da Paraíba, a floração dos ipês. Quase toda a população da cidade passa ali pela lagoa. Todos os ônibus a contornam. Quem tem carro, vez por outra passa por ali. Um belo dia, de fato, um belo dia de dezembro, a alma dos passantes se espanta com as copas douradas dos ipês.

Aí acontece uma mágica na cidade. Quem chega ao trabalho pergunta: vocês viram os ipês da lagoa? Quem volta pra casa, anuncia: os ipês da lagoa floriram. Quem arranja um namoro convida: vamos ver os ipês da lagoa? Os antigos amores revivem sob o teto dourado dos ipês da lagoa.

Depois vem o vento e derruba as flores mais velhas. Uma parte do ouro cai do céu e vem forrar o chão das margens da lagoa. Então, a mágica se completa. As pessoas se rendem por completo ao milagre do amarelo.

Mais uma vez é tempo dos ipês no coração da cidade. Mais uma vez, o ouro dos ipês se instala no coração das pessoas. Daqui a pouco, as folhas voltarão a ocupar o espaço das flores. Sabemos disto e ficamos um pouco tristes pela passagem deste tempo. Mas nos despedimos dele com uma ponta de esperança de que estaremos aqui quando voltar o tempo dos ipês.

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