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quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Águas quentes (Assis Coelho)



Quase tudo naquele hotel de Caldas Novas borbulhava de alegria. Crianças corriam e caíam nas piscinas com gritos estridentes. Muitas mulheres bronzeavam um corpo naturalmente branco. Outras mais receptivas aos ditames da natureza, portavam grandes chapéus que sombreavam suas rugas e estrias. Alguns homens com proeminentes barrigas estavam há horas no poolbar bebendo cerveja e esvaziando a bexiga no mesmo local. Indiferentes ao odor de urina continuavam ali bebendo placidamente, observando os passantes. O olhar se intensificava e buscava um movimento rotativo do pescoço um belo corpo de passava com requebros e indiferente aos olhares inquisidores.

Alguns homens acompanhados fingiam não ver nada ao seu redor além da amada que estava com ele. Em uma piscina ao lado, uma professora de ginástica clamava a todos a seguirem seus passos graciosos com a promessa de eliminarem toda a gordura do corpo em poucos aulas. Para isso exibia um corpo atlético de belas formas adquirido longe daquelas tentações oferecidas pelo hotel. Debaixo de uma árvore, um casal de adolescentes se beijavam numa tentativa canibalesca, enquanto se olhavam candidamente, balbuciando juras eterna de amor. Garçons passavam apressados, sobraçando bandejas com picanhas esfumaçantes. Um grupinho de mocinhas que se achavam representantes das topmodels dançavam ao ritmo de uma música eletrônica que lembrava um martelar sobre uma placa de metal qualquer. Pareciam quíntuplas gêmeas ostentando ossos e cabelos semelhantes. O som de risadas e gritos denunciavam que todos vieram para se divertir. Menos um senhor de cabelos ralos e grisalhos que fora deixado sentado sob uma árvore. Fora lhe prometido que aquelas águas eram milagrosas. Poderiam reativar membros esmorecidos e pernas atrofiadas, entre outros benefícios apregoados no prospecto que intitulava a região como O milagre das águas. O senhor já estava ali por duas semanas e continuava quase todo inerte. Seu olhar vagava indiferente e sem brilho para os arredores. Parecia buscar algo tão distante dali. Nem mesmo as belas passantes lhe interessavam. Os odores não estimulavam sua fome ou sede. De vez em quando, surgia uma moça que lhe limpava com um lenço sua boca, depois de lhe dar algo através de um canudinho. Passava a mão na cabeça do senhor e se retirava, saltitante para o braço do segurança do hotel que ficava ao longe. Depois de duas horas, quando o sol já estava deixando vermelha aquela pele ressecada, a moça se aproximou e perguntou: “O senhor quer alguma coisa”. Com muito esforço, mas pausadamente disse: “Eu gostaria de morrer!” Da piscina ao lado veio um jato de água quente que o molhou todo. Indiferente, deixou as gotas desceram junto com as lágrimas sobre o rosto enrugado. Os meninos riam e disputavam quem daria o mais alto pulo-mortal.
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