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quarta-feira, 20 de junho de 2012

Luciano Maia (W. J. Solha)

(Poeta Luciano Maia)


Tenho notado, ante tantos livros que venho recebendo ultimamente – num diálogo com os autores a quem remeti meu Marco do Mundo – que jamais escrevemos a somente um leitor. Daí que há poemas, versos ou estrofes que empolgam mais a sicrano do que a beltrano, enquanto fulano faz um rol diferente de suas preferências, e tudo fica como essas listas dos dez melhores filmes ou livros do ano ou de todos os tempos, em que jamais acontece unanimidade. Pois bem, acabo de receber dois livros do cearense Luciano Maia – “Claroscuro” além de “Mar e Vento”, – e fico com “Claroscuro”. E dos “16 motivos para um poema”, a segunda criação desse volume, deslumbro-me com estes 6:


A insônia dos cardumes\ as indecisões da vírgula\ o arrepio dos gumes,
mais
os tensos olhos do tigre\ o timbre do duro ferro\ o bombardeiro do brigue,

e
a última alvura do linho.
Borges – imagino – assinaria todos eles. Digo Borges para me dar aval do que realmente quero dizer: Eu gostaria muito de tê-los criado.
Os três versos finais de “Estrela em céu violeta” também são antológicos:
... rastros dos amantes, inquilinos
das noites que de então nos têm doado
aquele céu violeta e constelado.

Notáveis, também, estes três, no interior de “Vésper Lucífero”:
Não me ilude este frio calendário
de obrigações, consumo e hipocrisia.
O meu tempo melhor é o legendário

De novo:
“O meu tempo melhor é o legendário”!
Prossigo a garimpagem. Lá estão novas pepitas, em “Vácuo Vesperal”:
O que me traz esta tarde monótona
além do desejo de que termine o dia
e a noite anuncie uma quimera?

Isso já é uma lapidada joia à Bilac: “... e a noite anuncie uma quimera”...
O chumbo do céu pesa sobre as horas.
“O chumbo. Do céu. Pesa sobre as horas”!
E o fim da estrofe:
O carro que passou velozmente
levou a solidão para junto de outra
solidão.

A imagem é carregada de poesia!
Em “Destempo”, Luciano Maia fala em alva porcelana da lua. Já “O Silêncio dos Náufragos”, ele o abre com
Os navios submersos
se despedem dos espantos
O “Poema 31” fecha assim:
uma ruazinha que recorda
um poema de Mario Quintana...

De repente o poeta escreve, em “Abril, se a flor...”:
Abril, se a flor se abrir esplendorosa...
e o jogo de palavras me lembra Petrarca num poema inesquecível a Laura, que foi para ele alguém como a Beatriz de Dante:
L´aura che´l verde lauro et l´aureo crine
soavemente sospirando move.

Não preciso fazer mais nada.
Ganhei meu dia.

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