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domingo, 30 de setembro de 2012

Sobre cinquenta livros (W. J. Solha)



(W. J. Solha)

Em meio à trabalheira em que tento melhorar o libreto para a Ópera Vertical, encomendado por Eli-Eri Moura, com estreia marcada para 28 de novembro, enquanto tento dar continuidade a meu novo poema longo – Ecce Homo – que comecei em fevereiro, e ainda assimilo a repercussão dos filmes pernambucanos de que participei O Som ao Redor e Era uma vez eu, Verônica no Brasil e no exterior, dou-me conta de que, nestes últimos anos, escrevi cinquenta comentários a respeito de livros de autores brasileiros, especialmente paraibanos – romances, contos, poesia, ensaios de que mais gostei. Na verdade foram bem mais de meia centena, mas o excesso não é digno das obras que lhes deu origem. Até me desculpei com alguns autores por não conseguir encontrar caminho para o núcleo de suas criações, limitando-me a dizer-lhes uma coisa e coisa por e-mail, a respeito do que haviam publicado, e só.

sábado, 29 de setembro de 2012

Pensamentos (João Soares Neto)



                        (Airton Monte em entrevista a Ricardo Guilherme, TVC, Fortaleza)

Tempos há em que nos quedamos, a querer saber razões. Passamos em revista a família nuclear, os pais, os irmãos, os amigos, os colegas e os companheiros de trabalho. E a quais conclusões chegamos? Por que essa luta absurda que travamos se sempre aflora a quase incomunicabilidade entre os que se querem e lutam pelos mesmos princípios? Sei não. Logo, a Catrina ou o Ceifador atinge a amigos.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Horas gastas (Tânia Du Bois)




“...Onde os fantasmas que calavam /...e as coisas que as horas gastavam?...”
                                                                                                 (Lúcia Fonseca)

            Horas gastas é a arte de esquecer, é memória emotiva, aquela que se preocupa apenas em lembrar o que interessa como o essencial para viver. É preciso refletir para lembrar, identificar e imaginar. Nada mais apropriado do que a arte de ler, exercício que estimula a imaginação, sem gastar as horas. Segundo Orides Fontela, “Memória // A cicatriz, talvez / indelével // o sangue / agora / estigma.”
           

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Dom Airton das pernas finas (Pedro Salgueiro)

(Airton Monte por Raymundo Netto)
 
Nosso cronista Airton Monte tem sido tratado com bastante reverência, seriedade e pompa, advindas, claro, de sua cruel doença e lamentável morte. Aliás, como toda morte deve ser, sim, tratada. Mas me pego imaginando ele presente em seu velório, solenidade de cremação, missa de Sétimo Dia, escondido por trás de todos, rindo de toda aquela solenidade, com o traquino riso fácil que era muito dele: do escárnio de quem ria de tudo, de quem “gozava” do mundo, de quem “mangava” de todos.

Cadinho (Silmar Bohrer)





                                A vida não é
                                só uma reta:
                               
                                esquinas
                                curvas
                                subidas
                                descidas
                                quarteirões

                                risos
                                choro
                                loucuras
                                serenidade

                                outeiros
                                depressões
                                ansiedade

                                rosas
                                (de)lírios

                                luzes
                                sombras
                                obuses
                                alfombras

                                torvelinho
                                evidências

                                vida

                                cadinho
                                de vivências

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quarta-feira, 26 de setembro de 2012

O anão de Ronaldo Monte entre verbos e substantivos (Nilto Maciel)



(Ronaldo Monte)

Semana passada, recebi visita de Ronaldo Monte. Mora em João Pessoa (natural de Maceió) e veio a Fortaleza, com outros psicanalistas, para um encontro científico. Vinha da Europa, mas não se mostrou (porque não deve ser) enfatuado, não falou insistentemente em Paris, Roma, Londres, como o fazem alguns viajantes que vêm me causar inveja. Para lhes barrar os desígnios de malvados, tomo a palavra e me ponho a contar passeios pelos arredores da Torre Eiffel. Então eles se calam ou mudam de assunto: Cansei, Nilto, de tanto viajar pelo velho mundo. Agora é voltar para o Benfica, ler meus livrinhos comprados no sebo e sonhar com a glória literária.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

O luxo da memória (Ronaldo Monte)



(Igreja de Água Fria, no Recife)


Para Carlos Aranha

Estava ouvindo Handel no som do carro e de repente tive uma experiência rara. Me veio a lembrança das manhãs de domingo em Água Fria, o primeiro bairro em que morei no Recife. Bem cedinho, os fiéis eram chamados para a missa ao som da música mais bonita feita para o louvor de Deus. Eu não ia à missa, mas acordava feliz com a harmonia barroca que me prometia um longo dia de folga com direito a ver as moças passando para a igreja, um almoço melhorado e uma matinê com filme de caubói ou uma comédia com Jerry Lewis. Até hoje agradeço ao Cônego Jaime Diniz, pastor da paróquia de Água Fria, por me ter dado de presente esse conjunto de imagens que emerge em minha memória toda vez que ouço a música triunfante de Handel.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A musa: em Batista de Lima (Hermínia Lima)






(Publicado no Diário do Nordeste, Fortaleza, 22.09.2012)

Dizer algo sobre O sol de cada coisa, o décimo livro de Batista de Lima, é tarefa que deleita e que aflige

Tentar verbalizar ideias sobre os poemas deste livro é viver o paradoxo de querer calar e só sorver, com a subjetividade e o sentimento, o néctar que se derrama dos versos e, ao mesmo tempo, é viver a provocação de debruçar-se sobre a obra, munida com as armas da leitura técnica, para iniciar árdua e minuciosa análise sobre as infindas possibilidades que os versos nos ofertam. Sobre as infindas possibilidades ofertadas pelos versos de Batista, leiamos, a título de introdução deste diálogo, o poema Dúvida, que abre a primeira seção do livro, sob o título: Essa coisa de viver: (Texto I)


domingo, 23 de setembro de 2012

A OLARIA DO FILÓSOFO (Dércio Braúna)



A tarde é luz apurada
e sob telhados
repousam os barros da criação:

este, terra trabalhada;
e est’outro, oleiro,
barro da primeva criação.

O sol vai a meio
(não que se tenha partido,
só que vá a caminho de se pôr);

idem o homem, creio:
este sim, é um todo partido,
re-partido – barro que se fez ofensor.

Mas por ser indecifrável
na matéria humana boa parte,
são estas mãos, cardas e sem aprumos,

que têm, por inalienável
devoção, modelado por sua arte
o bem e o mal que somos

*Dércio Braúna é poeta, contista, ensaísta, autor de Metal sem Húmus e Como um cão que sonha a noite só. O presente poema foi extraído de O Pensador do Jardim dos Ossos.
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Hábil (Pedro Du Bois)





Hábil, rabisco verdades: levo o pão
sob o braço, comida faltante na mesa
do pai. Ofereço minha habilidade
desferida em tiros: atiro a esmo
nos cadáveres deixados. Vou
pelo caminho acrescentado
(no bolero reencontro os passos)
onde me encontro na habilidade
recíproca do renascimento.



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sábado, 22 de setembro de 2012

Memorial da Casa da Torre (Cyro de Mattos*)




               Autora muito premiada, com destaque para nove láureas concedidas pela Academia Brasileira de Letras, Stella Leonardos publicou mais de uma centena de livros, entre volumes de romances, poemas, literatura infantil e dramaturgia. Formada em Letras Neolatinas, tradutora do inglês, francês, italiano, espanhol, catalão e provençal, sua estreia aconteceu com Passos na areia, em 1941. Os críticos costumam situar a vasta obra poética de Stella Leonardos na terceira geração do Modernismo, relacionando, nessa condição, os livros Geolírica (1966), Cantabile (1967), Amanhecência (1974) e Romanceiro da Abolição (1986).
        

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Simone Pessoa e os pedacinhos do mundo (Nilto Maciel)




São poucos os livros de crônica chegados à minha casa nos últimos tempos. Porque, certamente, se editam mais romances, contos e poemas, além de biografias políticas, receitas culinárias, previsões de catástrofes e orientações para a salvação da alma. Apesar disso, sou leitor desse gênero híbrido (a crônica) tão fustigado por certos críticos. Gosto da crônica que se encosta no conto, às vezes distraidamente, outras propositalmente, como quem não quer nada, querendo. Apego-me também à ficção simples que deixa de lado o enredo e envereda pela poesia ou pela linguagem poética.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Dom Pedro II em Portugal (Franklin Jorge)





O imperador D. Pedro II do Brasil desembarcou em Lisboa no dia 12 de junho de 1871 na companhia da imperatriz e logo se tornou o alvo predileto da impiedosa lucidez dos jornalistas Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão, que se apresentaram a sua majestade sem temerem passar por imodestos, como dois sujeitos que “não são nada”...

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O Homem Desoriental I (Mariel Reis)




I
Meus pés embaralhados aos caminhos
Percorridos pelos seus pés...
Seguem ambos tão confundidos
Que não é mesmo possível
Saber quem caminha com o corpo do outro.

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terça-feira, 18 de setembro de 2012

Luz vermelha que se azula (Dias da Silva)



 
Para ler o que é bom, a condição é não ler o que é ruim. Daí por que leio tão somente o que é bom: por exemplo, os contos de Luz vermelha que se azula, do escritor Nilto Maciel.
Sempre ajudam no conhecimento do autor quaisquer referências. Assim, tenham-se estas: Nilto Fernando Maciel, nascido em Baturité, Ceará. Em parceria, cria, em 1976, a revista O Saco, de inúmeros leitores. No espaço entre 1992 e 2008, edita corajosamente e incansavelmente, Literatura: revista do escritor brasileiro, sempre bem acolhida, no cenário das letras.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Apontamentos com Airton Monte (João Soares Neto)


(Airton Monte)


“Nunca abrirei mão dos meus sonhos, mesmo que eles se transformem em pesadelos”, dizia ele. 1. Airton Monte viveu sempre na era de Aquário. Menino de colégio marista. Adolesceu no frigir dos anos 60, jogou peladas, pintou e bordou, sem esquecer-se de ler e estudar. Depois, já médico, andava com Rogaciano Leite Filho, entre outros, curtia os bares do Benfica, o Estoril, já na decadência, e amava a vida. Parecia o Leminski, a dizer: “Haja hoje para o tanto ontem”. 2. Tímido como um monge trapista, limpava as grossas lentes ao ver os balanços das cadeiras. Não as de sentar. 3. Deu-se um tempo nas traquinagens e casou-se com a prima, Sônia, sabedora de seus poréns, amante e companheira que lhe deu os filhos Bárbara e Pablo, hoje adultos e abalados pela perda do irmão maior que os adorava na sua esquisitice. Agora, eles são o Airton para a Sônia. Lutem pelo futuro para discernir o resultado do presente.

domingo, 16 de setembro de 2012

Esperanças (Teresinka Pereira)





Um momento, por favor!
A noite dorme tranquila:
porque queres devorar
o silêncio do infinito?
Deixa a minha angústia em paz!
Deixa que me proteja
de tuas pérfidas esperanças!


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