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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

O velho mundo de sempre (Ronaldo Monte)





Se você está lendo este texto, é porque o mundo não acabou no dia previsto pelos alarmistas de plantão. Quem torrou tudo o que tinha no cartão de crédito e no cheque especial, quem falou para o chefe tudo que estava engasgado desde a admissão no emprego, quem cantou a mulher do vizinho campeão de MMA, quem tomou um porre e soltou a franga, saiu do armário e rodou a baiana crente como o mundo ia mesmo acabar, deve estar se pondo a grande questão filosófica: como é que vou encarar essa mesmice? 


Não adianta espernear. Este é o mundo que temos para hoje e desconfio que o teremos ainda por um bom tempo. Judeus e palestinos continuarão a se matar, todos cobertos de razão. A China continuará a nos entulhar de quinquilharias e reduzir nossos empregos a pó. A guerra e a aids vão continuar despovoando a África até o último africano. As primaveras democráticas continuarão sendo substituídas pelos invernos totalitários. Os ricos vão continuar ricos e os pobres vão continuar pobres. E neste imenso gigante sonolento continuará valendo o princípio da “farinha pouca, meu pirão primeiro”. 

Felizmente, o mundo não acabou, pois as férias da moçada mal começaram e nestas margens do Atlântico estão acontecendo umas manhãs cinemascópicas. E se o mundo não se acabou, ainda dá tempo de telefonar para aquele amigo lá longe, mandar um e-mail para a parentalha, botando a casa à disposição. Dá para visitar aquela turma que a gente só encontra nos velórios dos amigos comuns. Dá pra conversar com aquele vizinho mal humorado que acorda você com o som nas alturas. 

Em vez do fim do mundo, qualquer um pode curtir um fim de tarde com quem gosta. Pode sair no fim de semana para um lugar diferente com quem ama. Pode chegar no fim do mês liso, mas feliz. Pode viver os dias do fim do ano sem lutar contra o tempo, sem buzinar nos congestionamentos, sem brigar com a moça do caixa. 

Melhor pra mim, que o mundo não tenha acabado. Fico pensando como ficaria eu sem o mundo. Sem o mar de Cabedelo, sem a ponta do Cabo Branco, sem a Serra da Borborema. Sem trabalho pra trabalhar, sem rede pra descansar, sem bebida pra beber. 

Melhor pra todo mundo que o mundo não tenha acabado. Fica todo mundo vivo, não sai ninguém e vai todo mundo botar a patinha na consciência para ver as besteiras que anda fazendo para acelerar o fim do mundo.

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