Escondido atrás do jornal, o professor Luiz Vaz passava o domingo. E catava pedras preciosas, por puro deleite. Ou para exibi-las a seus alunos.
Fora-se o tempo de Virgílio, Camões, Bilac. Agora só queria os novos poetas. Nada de vertitur interea coelum*.
Olhos enfiados no chão da folha, Vaz sonhava. Nunca o chamariam velho. Antes, o eterno jovem. O mestre da língua viva. Polêmico, moderno, brasileiríssimo.
Súbita emoção. Arregalou os olhos. Um poema de Noto de Sissa! Leu o título. Uma beleza! O primeiro verso. Um primor!
Com sofreguidão, percorreu todo o poema. Voltou ao título, ao primeiro verso. Releu tudo, cheio de entusiasmo.
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Na sala de aula, Luiz Vaz freou sua emoção. E amarrou a rubra língua no céu da boca. Queria um comentário escrito de cada aluno ao poema que copiava no quadro-de-giz.
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Riu na cara dos alunos. Não aprendiam nada. Pareciam idiotas. Especialmente a "crítica" feita por Oton.
– Uma barbaridade!
E se pôs a falar os versos de Noto de Sissa. Pequena obra-prima da poesia épica.
A maioria dos jovens abriu a boca e queda ficou. Um, porém, não concordou com a análise do mestre. E defendeu com língua e dentes sua opinião.
Irritado com a presunção de Oton, o professor tratou de humilhá-lo. Não passava de um aluno, um fedelho. Longe ainda se achava de atingir os primeiros degraus do saber. Enquanto ele, Luiz Vaz, já alcançara o ápice da cultura literária. Ora, exercia a crítica e a cátedra há trinta anos. Escrevia para revistas estrangeiras. Correspondia-se com pessoas do tamanho de Barthes, Foucault, Jakobson.
Oton de Assis nada mais falou. Na verdade, não podia se comparar àquele homem.
E continuou anônimo entre os colegas. Seu lirismo, porém, ainda germinaria páginas tão belas como as publicadas no jornal daquele domingo.
* Entretanto o céu gira. Virgílio, Eneida, Livro II; 250.
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