Translate

quinta-feira, 23 de novembro de 2006

Se não leu, leia... (Jorge Medauar)




Em 1977 foi publicada uma antologia do chamado "conto marginal", organizada por Glauco Mattoso e Nilto Maciel, cujo título é Queda de Braço. Ali apareciam autores, uns ainda imaturos, outros com certo pronunciamento mais literário, no sentido de melhor convívio com a difícil arte de escrever. E outros, ainda, já com embocadura de escritor. Dois deles eram exatamente os autores daquela antologia, na verdade um canteiro florindo para futuro literário. Nilto Maciel, cearense de Baturité, na ocasião com 35 anos, comparecia no volume com "As fantásticas Narrações das Meninas do São Francisco" e uma "tragédia wildeana" com o seguinte título: "Sururus no Lupanar". Esses dois trabalhos, além de seu livro de contos, já marcavam um autor realizado, ou pelo menos com embocadura para as letras. O tempo foi caminhando e Nilto Maciel também. Seu livro de contos Tempos de Mula Preta pelo menos por nós foi saudado como ótimo livro de histórias curtas, da mesma forma que A Guerra da Donzela, já reafirmado por várias edições. Depois, esses livros foram sucedidos por Punhalzinho Cravado de Ódio, também de contos.

Vem agora Nilto Maciel com o romance Estaca Zero, edição Edicon, garantindo a carreira ascensional de um trabalhador das letras, que já adquiriu pulso e sabe manobrar a peça literária, nela deixando os sinais de sua criatividade (não tivesse sido ele um publicitário, redigindo com o rigor que a profissão impõe). Infelizmente, na exiguidade de espaço aqui disponível, não se pode comentar com mais amplidão o desenvolvimento desse seu romance, que mostra, como diz a editora, "a ação jurídico-policial contra os favelados, a morte de um operário, a violência acobertada pela lei". Por essa breve indicação já é possível avaliar-se a importância e atualidade dessa história, que vem a ser um dos aspectos sociais da luta pela sobrevivência de grandes massas populacionais, injustiçadas pelos desníveis econômicos e pela incúria política e governamental. Um livro para ser meditado, diante das reflexões de seu narrador.

(Gazeta de Moema, SP, 15 a 21 de agosto de 1987)
/////

Um novo homem (Nilto Maciel)



No dia de seu último natalício, Erialdo se viu agraciado com um pequeno cão. O presente saiu do coração solteirão de uma colega de sala. Por que diabos fulana presenteou-lhe aquela coisa viva? Bem podia ter pensado num acessório para o carro ou numa camisa.

Com o tempo, Erialdo se afeiçoou ao animal, a quem deu o nome de Ecce Homo, em homenagem ao seu antigo professor de latim.