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quinta-feira, 8 de março de 2007

Sobre o inconsciente (Nilto Maciel)



Cornélio Basso fez uma pausa. Agarrou o copo e o levou aos lábios. Na platéia houve inquietação. Alguém tossiu. Da primeira fila de cadeiras pareceu sair um homem agachado, ou pequeno. Uma criança, talvez. Pôs-se de quatro, de costas para o orador, no início do corredor atapetado. Cornélio voltou a falar. Os desejos recalcados não deixam de ter uma existência no inconsciente. No entanto, a platéia se mostrava inquieta. Ouviram-se sussurros. O homem agachado pôs-se a andar pelo carpete vermelho, rumo à saída. Subiu o primeiro degrau, caminhou, subiu o segundo. No inconsciente os desejos inconciliáveis podem coexistir. Na primeira fila uma cabeça olhou para trás. O fugitivo já ia quase ao meio do corredor, a passos lentos e cadenciados. Os desejos inconscientes não são modificados nem pela realidade exterior nem no decorrer do tempo.

O mistério tem os seus fascínios (Francisco Carvalho)



 
De 1974, data de sua estréia com o livro de contos Itinerário, até 2003, quando publicou sua obra mais recente, intitulada A Última Noite de Helena (Editora Komedi, 108 p., São Paulo), Nilto Maciel consolidou seu prestígio como um dos melhores ficcionistas brasileiros da atualidade. Em vinte e nove anos de atividades literárias, sua bibliografia reúne treze livros de ficção e um de poemas. Em todos esses títulos sobram evidências de que o rigor estético e a qualidade constituem preocupações fundamentais do autor.