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quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Trapos (Nilto Maciel)



Tomás olhava para os carros em movimento. Trânsito maluco! Os motoristas dirigiam em alta velocidade. Agarrado ao volante, Gilberto nem piscava. Já se tinha acostumado àquilo. Dirigia em Brasília há quase vinte anos. E também no Rio, em São Paulo, outras cidades, estradas. Não apenas acostumado: não sentia nenhuma dificuldade em dirigir. O colega afrouxou o laço da gravata, coçou o queixo e se voltou para ele. Como as pessoas podiam se acostumar ao caos? Carro, o grande mal da humanidade. Se o homem não acabasse com o carro nos próximos dez anos, a vida ia ficar insuportável. Não falava apenas da poluição, porque os combustíveis usados hoje podiam ser substituídos por não poluentes. Falava do excesso de veículos nas ruas, dos engarrafamentos, dos atropelamentos, dos acidentes. Além disso, as pessoas não andavam mais, viviam dentro dos carros. Gilberto tentou falar. O outro aumentou o tom da voz. Sempre mais solidão, o isolamento das pessoas. Gilberto sorriu e levou a mão direita ao boné. Ora, não fossem os carros, seria muito mais difícil viver nas grandes cidades. 

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Seca: A estação do inferno (Dimas Macedo)


(Teoberto Landim)

A formação de um escritor de talento está ligada, indissoluvelmente, à capacidade por ele demonstrada de reduzir, ao plano literário, de forma continuada, obsessiva e sempre com ânsias de perfeição e aprimoramento, a dispersão do seu imaginário, dando-lhe unidade e sentido morfológico e polifônico.

Todo escritor que se preza é resultado desse desafio e dessa intermitência que se alojam nos recessos da sua vida interior. Já sustentei que a inspiração é um elemento secundário na perspectiva de um produtor cultural de estofo. Ela configura, às vezes, apenas um sinal ou pode expressar também um signo que o movimento das forças sociais coloca diante da realidade que se quer mutante em face de um mundo conturbado.