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terça-feira, 12 de outubro de 2010

Contestação consciente (Henrique Marques-Samyn)

(Tanussi Cardoso)

As referências à poesia brasileira produzida ao longo da década de 1970 tendem a evocar imediatamente os nomes relacionados à chamada "poesia marginal" – embora o pressuposto de que a todos os autores que produziram durante aquela época possa ser aplicado esse rótulo seja equivocado, sendo prova recente disso o volume referente aos Anos 70 da antologia Roteiro da poesia brasileira, organizado por Afonso Henriques Neto. Não obstante, se aquela "marginália" legou para a poesia brasileira um conjunto de importantes elementos, teve por outro lado ecos negativos que se prolongam até os dias atuais. Esses prós e os contras foram proveitosamente sintetizados por José Paulo Paes, de cuja análise destacamos, de um lado, a contestação dos valores estabelecidos a partir de uma opção existencial e o questionamento do bom gosto das elites lítero-sociais; e, de outro lado, a desorientação, a desinformação e o descompromisso com diretrizes estéticas que, na maior parte das vezes, resultou numa produção circunstancial e efêmera.A estreia literária de Tanussi Cardoso ocorre apenas no fim da década de 1970: Desintegração data de 1979, o que em primeira análise nos permite postular que sua obra não representa fielmente o ideário predominante na "marginália". De fato isso ocorre, mas não porque seja o poeta um epígono, ou porque meramente espelhe a estética predominante naquela época; uma leitura do volume dedicado à sua obra na valiosa série 50 poemas escolhidos pelo autor (Galo Branco, 2008) demonstra que, se Tanussi Cardoso é o autor de uma poesia que contesta os lugares-comuns e desconstrói o discurso literário essencialmente a partir de uma postura existencial, cumpre essa tarefa por intermédio de uma poesia que nada tem de gratuita. Sob uma dicção aparentemente fácil e despojada, Tanussi Cardoso ergue uma poesia densa, que resgata e atualiza alguns temas perenes da história da literatura.As duas últimas partes do livro, por exemplo, reúnem poemas que tratam precisamente de dois desses motivos universais. Em "Do amor", encontramos o belíssimo "Fado", que merece ser transcrito na íntegra:

Agora, podes ficar onde a tormenta não mais te alcança.

Onde Deus não mais te eleve.

Onde o mar não mais te salgue.

Onde o azul não te aborreça.

É assim o amor – vela por nada.

Cuida por nada.

E quando pensas que és,

teu sangue estanca.

Já em "Das mortes" lemos o excelente "O morto", que tem esta última estrofe:

Tudo permanece em seu lugar.

(...)

O morto é um poema

acabado

solto

completo.

Vê-se, portanto, que Tanussi Cardoso é um poeta que habilmente maneja os recursos formais, jamais mobilizados em favor de artificialismos; em sua poesia, tudo está a serviço de uma expressividade absoluta. Para além disso, atravessa a sua obra um lirismo que nasce das vivências cotidianas, cabendo pôr em relevo uma característica particular: se Tanussi Cardoso se alinha aos poetas que buscam dilatar as fronteiras do poético, nele incluindo também as (supostas) trivialidades do dia-a-dia, importa observar que dificilmente seu lirismo se limita à superfície, havendo uma pungência que a ultrapassa em direção àquela angústia metafísica que sempre assola o humano, decorrente da certeza da finitude e da incerteza da existência. Exemplo disso é um poema como "Oráculo" – raro pela construção precisa, pela força lírica e pela eficácia das imagens –, do qual transcrevemos o trecho final:

mas não quero falar disso agora.

tantas idas e vindas.dor no coração fodido.

vôo e nem acredito.

vôo e nem domingo.

sábado e nem comigo.

vôo e nem futuro.

só preciso disso:

a paz inalcançável do gesto da mão no ar no vento

como um corte lento e gosmento.

silencioso.brutalmente silencioso.

como um poema. límpido como um santo caído das nuvens.

como um poema. gênesis.

como um poema. estupidamente triste.

como um poema. sutil e inacabado.

como um poema. belo e qualquer.

mas não quero falar disso agora.

As anteriormente mencionadas observações de José Paulo Paes acerca da poesia produzida nos anos 70 dizem respeito a problemas que encontramos ainda em poetas atuais, relacionadas à carência cultural e a deficiências na formação literária que conduzem a tentativas de enfrentamento que, por sua ingenuidade e ineficácia, denunciam a inconsequência dos que tentam empreendê-las. Melhor fariam esses autores se seguissem o exemplo de Tanussi Cardoso, contestador consciente, cuja competência no fazer literário é inegável.


Crítica sobre o livro 50 poemas escolhidos pelo autor, da Ed. Galo Branco, publicada no blog

Henrique Marques-Samyn nasceu e cresceu nos subúrbios cariocas. É escritor, tradutor e pesquisador acadêmico, autor de Poemário do desterro, Esparsa erótica e de diversos artigos acadêmicos. Articulista do Jornal do Brasil e da revista Speculum, tem textos publicados no México, na Venezuela e na Espanha. É doutor em Literatura Comparada (UERJ), mestre em Psicologia Social e em Filosofia.
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segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Ceará (Jéssica O. Dias)

(Nasci no dia 13 de março de 1996 em Fortaleza. Estou no 9° ano do ensino fundamental dois e estudo no Colégio Maria Ester 1)




Ceará terra da luz,


É uma “boniteza” que seduz.


O povo do sul nas férias nem demora,


Faz as “mala” e vem “simbora”.


Também numa terra dessas,


Cheia de José, Raquel, Patativa...


Um bando de cabra macho,


Com as suas “Maria Bonita”.


Quem é que não vem conhecer,


As histórias do Ceará.


Mais engraçadas que piada boa,


“Arrodeam” o mundo sem ninguém decepcionar.


Nossos livros regionalistas,


Fazem mais sucesso,


Que artigo bom de jornalista.


Quem é que nunca ouviu,


Um repente cearense?


Quem nunca dançou um forró,


Ou xote nesse sol quente?


Ô povo “arretado”,


Da literatura danada de boa.


Aqui, lixo se “rebola” no mato,


E as “conversa” voa.


Foi aqui que a abolição começou


E um sol mais igual brilhou.


Ô povo invocado,


Gente boa de memória.


Um povo simples e engraçado,


Mas pense, que o cearense faz história!
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