Translate

domingo, 21 de novembro de 2010

Um olhar (Ádlei Carvalho)

http://adleicarvalho.blogspot.com/


(Quadro de Chico Lopes)


Quero ainda algum tempo

Para cantar mais canções,

Contar mais estrelas,

Plantar mais flores

No coração,

Trilhar mais versos,

Romper barreiras,

Distribuir outros sorrisos,

Reler “O Pequeno Príncipe”,

Respirar mais verdes

E verdades,

Multiplicar afetos.



Tempo para aprender a olhar

Além dos outros olhos,

A estender incondicionalmente as mãos,

A ouvir mais que dizer,

A sofrer sem murmúrios

E seguir adiante.



Tempo para beijar a minha mãe,

Amar a minha mulher,

Abraçar meus irmãos,

Orar a Deus por meu pai.



Tempo para galgar degraus,

Subir em árvores

E montanhas,

Sentir a brisa,

Correr descalço,

Ouvir um samba

De Chico Buarque,

Aprender a dançar tango.



E quando eu me for

E o tempo já não fizer sentido,

Quero saber que tudo

O que vivi e desejei ter vivido

Não durou mais que o instante

De um olhar.
/////

sábado, 20 de novembro de 2010

Conversa com Caio (Parte 3)


NM – Como você recebeu a indicação de seu livro Trapiá para o vestibular da Universidade Federal do Ceará e como se sente com a 4ª edição de O sal da terra? Para nós, seus amigos, admiradores, leitores, sua obra merece muito mais que indicações para concursos e reedições. Você se sente pouco prestigiado? É assim mesmo? Um dia reconhecerão o seu imenso valor?


Caio – Não sei nem como de fato lhe responder. Há muitos prós e contras. Dou alguns rápidos exemplos. O romance O sal da terra está com duas adaptações para o cinema. Esteve a ponto de ser filmado. E não foi. Está com tradução pronta para o francês e ainda não publicado na França, embora já tenha saído na Itália e Líbano. O meu livro de contos O Casarão, que ganhou o Jabuti de 1975, da Câmara Brasileira do Livro, esteve a ponto de ganhar o prêmio Governador do Estado de São Paulo. Houve indecisão entre os jurados durante vários dias e perdi por um voto. Em compensação, o meu livro de contos Os meninos e o agreste, que ganhou o prêmio da Academia Brasileira de Letras, em 1971, ficou empatado com o livro da filha do Guimarães Rosa, Vilma Rosa, autora de Acontecências. Tristão de Ataíde, depois de dias, desempatou a meu favor. E assim muitos outros balanceios. Quando o Trapiá foi indicado para o Curso de Letras da Universidade do Ceará, claro que fiquei satisfeito. E fiquei mais ainda quando ele foi indicado no ano seguinte e alguns contos dele estão sendo filmados no Ceará. Então, meu amigo, quem se mete com letras passa por essas coisas. Vou lhe dizer uma, e não é modéstia: é meu feitio. Nunca me promovi nem lutei para conseguir alguma coisa nas Letras. O que veio recebi com agrado, mas sem exaltação, sem euforia, e não me pergunte por que... Nunca cogitei de entrar para uma Academia, embora pertença a uma Academia de Letras de Brasília, fundada por Almeida Fischer, ao Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, ao Pen Club, a uma Academia em Buenos Aires (e nunca fui lá)... e sócio-correspondente da Academia Cearense de Letras. É uma questão de temperamento. Se me oferecerem, muito bem. Do contrário, não perderei o sono. O que vale é que tenho amigos valorosos no País inteiro que, por um motivo ou outro, gostam do que escrevo. O resto, meus livros dirão por si no futuro. Mais só uma coisinha: o meu conto "O pato do Lilico", do livro Trapiá, está em 14 antologias de contos e sempre me pedem para publicar em outras. Vou acrescentar uma coisa que me agrada: fiz a apresentação de aproximadamente uns 300 livros e não fiquei rico. Se eu tocasse rock a conversa seria diferente. Sou muito apegado às minhas raízes. Estou em São Paulo há pouco mais de 50 anos e já voltei ao Ceará umas 90 vezes. Em breve estarei retornando à terrinha.

NM – Creio que tocamos nos pontos essenciais. Podemos dar por encerrada a entrevista. Porém, deixo com você o ponto final. Tem algo a dizer mais? Fique à vontade.

Caio – Creio que falei até demais, eu que sou sucinto em tudo, a não ser em bate-papos.
/////