(José Alcides Pinto)
Concluí a leitura de A Face do Enigma, de Dimas Macedo, pouco antes da hora do almoço. A caminho do restaurante, planejei escrever uma resenha dele ou mesmo uma crônica. Faria isto à tarde, logo após a sonequinha de praxe. Certamente não conseguiria consumar a tarefa no mesmo dia. Não fazia mal. Levaria dois ou mais dias a arrumar as frases. Nada de pressa. Afinal, Dimas Macedo e Alcides Pinto merecem o melhor. No meio do repasto, lembrei-me de umas contas a pagar. Ora, não poderia tirar a costumeira soneca e, muito menos, iniciar a modelagem do texto naquela tarde. Almocei devagar, pensei nas dívidas e programei a ida ao banco. De volta ao lar, liguei a televisão e me pus a ver bandidos de todo tipo: fulano superfaturou a construção do metrô; beltrano gastou milhões na campanha eleitoral, com dinheiro doado por fulano; sicrano abençoou a placa de bronze do metrô e seus realizadores; outro fulano de paletó e gravata pedia aos fiéis uma moedinha (o troco do bilhete do metrô) para a ereção do templo do salvador do universo em expansão. Irritei-me, desliguei o aparelho e cochilei no sofá. Minutos depois (certamente mais de trinta), a sirene do telefone me despertou. Calcei os chinelos e mudei o tom da voz: Sapataria do charco, boa tarde! Todo dia invento frases desse tipo, para me livrar de cobradores, vendedores de apólices, prometedores de paraísos e outros adoradores de bezerros de ouro. Muitas vezes me dou mal e peço mil desculpas.