Quero falar da memória não como algo mecânico, mas como base de toda a identidade. Memória como instrumento de justiça e de misericórdia. Não por acaso, na mitologia grega, Mnemosina, a memória, é a mãe das Musas, ou seja, de todas as artes, do que dá forma e sentido à vida. Sim, ela protege a vida do nada e do esquecimento. A literatura não deixa de ser (também) um instrumento de transfiguração de um momento (eternizar a memória). Uma busca de perenizar o instante para convertê-lo em sempre. O ato da lembrança é ao mesmo tempo caridade e justiça para as vítimas do mal e do esquecimento. Muitas vezes, indivíduos e povos desapareceram no silêncio e na escuridão. Muitos devem se lembrar das ditaduras que, apagando as fotografias dos banidos querem, em verdade, apagar a sua memória. A memória é resistência a um tipo de violência: àquela infligida às vítimas do esquecimento. A memória é o fundamento de toda identidade, individual e coletiva. Guardiã e testemunha, a memória é também garantia da liberdade.
