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segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Rita no Pomar (Cláudia Fonseca)



Solitária, amargurada, misteriosa. O romance Rita no Pomar, à primeira vista, é apenas o desabafo do que poderia ser uma simples mulher, como tantas outras, com seu cachorro Pet, único a quem ela tem coragem de contar seus segredos mais obscuros. Quem tem a oportunidade de ler esse breve romance pode achar, no início, que só se trata de um texto coloquial divido em capítulos simples, observados a partir das embaralhadas anotações de Rita em seu diário, ou das revelações feitas ao seu companheiro e confidente. Frases longas dão ao leitor a sensação de confusão, o que, acredito, tenha sido o intuito do autor Rinaldo de Fernandes, ao criar uma personagem que foge da grande São Paulo para viver em algum lugar perdido no litoral paraibano. Durante os momentos em que Rita interage com Pet, o que percebemos é um texto que reflete de forma simples e precisa uma conversa do dia-a-dia. Para criar um ambiente mais próximo e verdadeiro do que acontece no exato momento da leitura, as narrações de suas vivências são intercaladas com observações feitas ao seu cachorro. Tudo, na mesma frase. Ao embarcar nessa viagem, temos a oportunidade de entrar no universo de uma mulher que, a cada página, revela não só o seu passado, mas a sua ambígua personalidade. Os acontecimentos, contados a Pet fora da ordem cronológica, dão a sensação de ir e vir da estória. Os recortes de sua realidade são desvendados aos poucos, deixando lacunas em alguns acontecimentos. Mas, ainda assim, acabam se encaixando, como se cada trecho de seu relato estivesse esperando sua continuidade mais à frente. A variação é entre o morno e envolvente, mas a grande sacada está nas últimas linhas do livro. Rita abre seu coração e vai se mostrando ao longo desse enredo. Porém, apenas no final é possível descobrir (quem sabe?) quem realmente é essa surpreendente jornalista, que larga a vida em uma metrópole para viver em um abandonado terreno com pomar, na beira de uma distante praia, trabalhando como atendente de um simples restaurante de estrada.

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Claúdia Fonseca é jornalista carioca. Rita no Pomar é uma publicação da Ed. 7 Letras (RJ): http://www.7letras.com.br/
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sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Realeza (Ailton Maciel)





















Lenta, calma, tristonha a noite corre.
E preclara, sem pejo, surge a aurora.
E a mesma luz, o mesmo sol me cora.
O mesmo dia em cada noite morre.

Assim a vida pelo além percorre,
e em cada passo minh'alma triste chora,
e com perrice a dor no peito mora,
e à mesma luz o meu viver recorre.

Triste, sem amor, cansado, fatigante,
sem pão, sem lar, com a voz quase ofegante,
eu piso nos espinhos da tristeza!

E embora no viver dos mais tristonhos,
eu canto amor no campo dos meus sonhos,
e choro a dor no altar da realeza.

Fortaleza, 21/9/59
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