Liana Bennato sorriu e fez mais uma pergunta. Se Amapa conhecia o Amapá. O grande astro também sorriu e tudo nele brilhou: os dentes, os olhos, os brincos, o cabelo.
O homem e a mulher não despregavam os olhos da televisão, enquanto as crianças brincavam, sentadas a um canto da sala.
— Não façam barulho.
Amapa não parava de sorrir e brilhar, e a bela repórter enrodilhava-se toda diante dele. O grande público certamente delirava à frente dos televisores. Como o homem e a mulher que ralhavam com as crianças em brincadeira.
— E a origem de seu nome?
— Eu já havia escolhido meu nome artístico, quando uns amigos criaram Amapa. Segundo eles, muito mais comercial.
Liana Bennato repetiu para os telespectadores o vasto nome de batismo do artista: André-Maria Ampére Parente.
— Alguma homenagem, Amapa?
— Acredito que à eletricidade. Meu pai era eletricista.
— Você se refere à palavra ampère, não é? E de onde vem André-Maria?
O homem e a mulher sacudiram-se no sofá e chamavam a atenção das crianças para a entrevista.
— André e Maria, vejam, vejam!!!
— Que coisa mais linda! — derretia-se a mulher.
A loira repórter também brilhava diante das luzes: qual teria sido então o nome artístico dado a si mesmo por Amapa?
— A. Parente.
— Não, não ia ficar bem — considerou o homem.
— Eu preferia Amperente — luziu a mulher.
Nem assim os dois pequenos desviaram a atenção de suas bugigangas.
— Amapa, fale-nos de seus planos para este ano.
O grande astro falou primeiro do disco a ser gravado nos Estados Unidos e, em seguida, passou à turnê pela Europa.
O homem e a mulher continuavam ligados à tevê, olhos arregalados, ouvidos abertos, respiração presa. Amapa cativava ambos os sexos, agradava a gregos e troianos, compunha, cantava, dançava. Um poeta inimitável.
— Compre o disco novo do Amapa — ordenava a mulher.
— Já comprei — adiantava-se o homem.
Ora, então ia deixar de ter à mão aquela voz maravilhosa? Há mais de dez anos acompanhavam o sucesso de Amapa. Desde o primeiro LP.
— Você se lembra, meu bem?
— Claro que me lembro.
Havia até um cantor muito parecido com ele.
— Quem era, hem?
— Não me lembro agora.
As crianças não ligavam para a televisão, nem para o homem e a mulher extasiados diante dela. Preferiam brincar. E tudo lhes servia de brinquedo. Tudo o que não interessava mais ao homem e à mulher.
— Me dá isso, pai.
E a velha lista telefônica virava aeroporto. Os aviões nem sempre tinham asas e só faltavam se espatifar na hora do pouso.
— Não façam barulho, filhinhos.
No televisor, Amapa cantava trechos de uma das músicas do novo disco. A repórter delirava. O homem e a mulher deram-se as mãos.
— Amapa, sempre Amapa.
Os pequenos esfregaram um objeto no chão da sala. Uma velha capa de disco. Ora, aquilo irritava. Parassem já com a esfregação.
— Amapa, conte-nos aquela história da festa – pediu Liana.
O astro sorriu e tudo nele brilhou: os dentes, os olhos, os brincos, o cabelo. Acreditava no destino. Desde menino sonhava com o sucesso. Um dia, descobriu que se parecia naturalmente com certo cantor de nome L. Veríssimo, então no auge da fama. E resolveu aproveitar-se daquilo, apesar de ser muito mais novo do que o cantor.
— A festa não tinha nada a ver com a música. Era o casamento da filha de um político importante, que, aliás, já morreu. E eu simplesmente fui à recepção, como se fosse L. Veríssimo.
— E ninguém desconfiou de nada?
— Não sei. Só sei que olhavam muito para mim. O resto você sabe.
O homem e a mulher gargalhavam, batiam palmas, faziam o maior barulho, enquanto as crianças rasgavam livros e capas de discos antigos.
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