Não dedicarei uma crônica a cada publicação recebida, por falta de tempo (passo dias e dias a rabiscar uma crônica, um artigo, na maior dificuldade). Sendo assim, apenas lembrarei, nesta nota de rodapé, oito impressos lidos, com muita satisfação, nos primeiros dias de novembro de 2011. São de variados gêneros: dois de poemas, dois de crônicas, três de contos e um romance. Os autores são meus amigos (entretanto, a maioria deles nunca vi), dois moram em Fortaleza (Dias da Silva e Raymundo Silveira) e os demais em cidades distantes daqui (Ádlei Duarte de Carvalho, em Belo Horizonte; Carlos AA de Sá, em São João da Barra, RJ; Franklin Jorge e Paulo de Tarso Correia de Melo, em Natal; e Urda Alice Klueger, em Blumenau, SC).
De poemas são Voz verso viola em Mangabeira – II, de Dias da Silva; e Livro de linhagens, de Paulo de Tarso Correia de Melo. De crônicas, Trinados para o meu passarinho, de Urda Alice Klueger, e O spleen de Natal: romance de uma cidade, de Franklin Jorge. De prosas ficcionais curtas, Noites de lobisomem e outras histórias, de Carlos AA de Sá; Louca uma ova e Lagartas-de-vidro, ambos de Raymundo Silveira. O romance é Triângulo vermelho, de Ádlei Duarte de Carvalho.
Vejamos um pouco de cada um:
– Voz Verso Viola em Mangabeira – II (Fortaleza: RDS, 2011), de Dias da Silva (organização e comentários). Coleção Binóculo 2011. Trata-se de coleta de poemas populares de cordelistas, repentistas e cantadores nascidos em Mangabeira, Ceará, (ou lá viveram). Dias da Silva justifica a obra assim: “A organização do volume II de Voz Verso e Viola em Mangabeira é uma tentativa de resgate e de dar suporte material à poesia anônima e escondida nas gavetas de poetas, repentistas e rimadores que, com seus versos, amenizam a carranca da vida e lhe dão um pouco de graça”.
– Livro de linhagens (Mossoró: Sarau de Letras; Porto-Portugal: Corpos Editora, 2011), de Paulo de Tarso Correia de Melo. Explicação do poeta, na página inicial do tomo: “Já se disse que uma rua de Paris é um rio que vem da Grécia, tentativa de resumo da marca helênica no mundo neolatino. Estas linhagens me ocuparam desde o meu primeiro livro de poemas, ao qual se seguiu uma dúzia de outros”. Segundo o sábio Sânzio de Azevedo (quarta-capa), o poeta potiguar “escreveu um livro de rara beleza, com fina sensibilidade e profunda erudição”.
– Trinados para o meu passarinho (Blumenau: Editora Hemisfério Sul, 2009), de Urda Alice Klueger. São 21 crônicas, que vão de “As borboletas de Mário Quintana” até “Gato malhado”. Urda é apaixonada pela natureza, pela vida. Vejam o tanto de animais em seus escritos: borboletas, passarinhos, beija-flores, garças, pombos, patos, gansos, cisnes, gatos, etc. E os vegetais? Inúmeros. Na primeira crônica se lê: “É outono no sul do mundo. Estou numa ilha ancorada no Oceano Atlântico, e uma cigana tenta me vender tapetinhos que não quero, que nada têm a ver comigo”. Urda Alice é poeta. Vejamos este trecho da última peça: “Quando eu conheci esse Gato que hoje está todo malhado, acho que nem a mais leve geada caíra, ainda, sobre aquela seda tão fascinante dos seus cabelos e da sua barba”. Como se vê, o gato malhado é um “rapaz bonito”.
– O spleen de Natal: romance de uma cidade (Natal, RN: EDUFRN – Editora da UFRN, 2001), de Franklin Jorge. A reunião é apresentada por Renard Perez, em “O escritor de uma cidade”, como tendo “um tom a bem dizer proustiano nessa sucessão de depoimentos devidas de figuras deste ou daquele meio e situação social – sobretudo artistas, escritores de outras gerações, gente simples do povo, tipos pitorescos, através dos quais a cidade vai se entremostrando, se apresentando”. É obra rica, exuberante de informações, confissões, observações. Escrito formoso, pleno de arte. “Belíssimo livro”, no dizer de Renard. Capítulos (e não crônicas) de uma memória (ou romance), sem protagonista. Ou será a cidade a grande personagem? Após as quase 300 páginas de letras redondas, coloridas e de uma sonoridade natural, vê-se um “álbum de retratos” (em preto e branco), de figuras singulares da cidade ou que por lá passaram, prédios antigos (demolidos), paisagens de Natal.
– Noites de lobisomem e outras histórias (São João da Barra, RJ: Cultura Goitacá, 2010/2011), de Carlos AA de Sá. Sem abas. Coletânea de contos. O primeiro: “Noites de lobisomem”. O derradeiro: “Indisponível para o amor”. Carlos escreve bem, desde 1972 (Canto tentado, poesia). Dedicou-se à narrativa curta e ao verso, mas também enveredou pela novela e pelo romance (O tesouro santo de Valetas, 2010). Constrói frases sem estardalhaço, como se usasse ferramentas de pluma e operários de mãos de maestro: “A água caía do céu em bátegas e o vento zunia em rajadas. Açoites de água. Vento alucinado”. É a história do lobisomem.
– Louca uma ova (Fortaleza: Premius, 2010) e Lagartas-de-vidro (São Paulo: All Print Editora, 2011), de Raymundo Silveira. Ambos de composições ficcionais curtas. O primeiro rendeu a Ray (apelido carinhoso do escritor) o “Prêmio Milton Dias”, de crônica, promovido pela Secretaria de Cultura do Ceará, em 2010. O segundo também foi premiado: “Concurso nacional de conto e poesia”, Correio das Artes, Paraíba, 2010. Para Duílio Gomes, nas abas daquele, as crônicas de Ray são “leves, divertidas e curiosas, bem no clima e estilo de Henrique Pongetti, Paulinho Mendes Campos e Fernando Sabino”. No Lagartas, as orelhas são de Maria Valéria Rezende: (...) o contista “transita por várias sendas da experiência e da linguagem humanas, atravessa num átimo a fronteira entre o mais cru realismo e o fantástico, engana o leitor fazendo- crer que lê uma simples crônica” (...). E mais eu transcreveria, fosse dado a mim o tempo necessário a um bom relato.
– Triângulo vermelho (São Paulo, SP: Agbook, 2011), de Ádlei Duarte de Carvalho. Segundo romance desse mineiro de 1969. O primeiro é A travessia. Ádlei tem muito fôlego, como se exige de romancista. São quase 300 páginas de muita narração, alguma descrição e informação, poucos diálogos. O narrador assim inicia a história: “Abriu os olhos e tudo lhe pareceu dolorosamente quieto. Tentou mover a cabeça, num esforço por compreender o que se passava”. Nas descrições não se derrama: “Havia ainda o açude: a represa feita por seu avô em um córrego sem nome, que dava água aos borbotões à fazenda e à família inteira”. Completa umas e outras com 55 notas de rodapé: nomes de rios, córregos, localidades, topografia, personalidades de Minas, fatos históricos, etc. Ádlei não quis apenas contar um drama à moda antiga (linear); quis se apresentar “como descortinador das coxias em que os seres humanos desenham a geografia psicológica e comportamental com que se opõem diante do grande palco do teatro da vida”, segundo o prefaciador Carlos Lúcio Gontijo.
Para encerrar esta nota informativa, anuncio a chegada de mais nove volumes (depois direi os títulos e os autores) e me digo satisfeitíssimo com a leitura que fiz destes oito. Muito obrigado à catarinense Urda Alice Klueger, aos cearenses Raymundo Silveira e Dias da Silva, ao fluminense Carlos AA de Sá, ao mineiro Ádlei Duarte de Carvalho e aos potiguares Franklin Jorge e Paulo de Tarso Correia de Melo.
Fortaleza, 14 de novembro de 2011.
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