Estamos todos reunidos novamente. Sem exceção, pois mesmo os invisíveis são pressentidos em algum canto da sala. Alguns destes não puderam vir, mas estão em algum lugar do mundo a se lembrar de nós. Outros deixaram de vir porque se foram definitivamente. Mas não interessam onde estejam realmente. Estão todos aqui. Se apurarmos os ouvidos, ouviremos suas vozes em meio à algazarra dos visíveis. Aqui e ali, eles deixarão entrever a marca registrada de um gesto, uma forma de olhar.
Estamos todos reunidos novamente. Alguns deixam bem claro o prazer de conviver conosco mais esta noite. Outros manterão o olhar vago e a expressão ausente de quem não está nem aí. De corpo inteiro ou três por quatro, é bom que nos vejamos mais uma vez. Alguns são velhas companhias de nossa trajetória pelo mundo. Outros só recentemente vieram se juntar à caminhada. Mas um fio de afinidade nos une a todos. E, um pouco mais, um pouco menos, todos nos queremos bem.
Sei que alguns solitários se sentirão excluídos desta crônica. Mas lembro a estes que uma sala virtual pode reunir todos os seus ausentes. A memória tem esse poder de atravessar o tempo e acender a lembrança desses que, por um motivo ou por outro, já não nos convivem mais.
A cada ano que passa, vai sumindo o sentido do Natal como uma festa cristã. Nos filmes de minhas netas, o velho do ho-ho-ho tomou definitivamente o lugar do aniversariante. O frenesi da lista de presentes substituiu o culto do eterno renascimento da esperança. Se quisermos, portanto, resguardar o sentido desta festa, temos que celebrar com ela a esperança. Claro que os dias que se seguirão darão um jeito de nos mostrar que nossa esperança é vã. Mas é preciso teimar em mantê-la como a única força capaz de nos unir em busca de um mundo mais fraterno, onde possamos conviver em paz com a presença dos nossos vivos e a memória de nossos mortos.
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