Como costumo ler com marca-texto na mão, O Sol de Cada Coisa - de Batista de Lima - me proporcionou bela coleção de achados:
Palavra são panos poucos
a cobrir tantos abismos
um domingo
que se cansou de ser semana
a procissão se indo
com um santo de costas
no vazio do andor
Aquele homem que passa na rua
pensa que está sozinho
mas aqueles passos não são seus
como estes versos não são meus
uma gaveta em que se
perdeu a chave
uma casa em que se
perdeu a porta
Ai de mim se não fossem
(...) o clamor dessas páginas brancas
(...) e esse rancor submerso
no subterrâneo das palavras
Há dias em que pareço (...) um policial sem farda
Noutros (...) com Roberto Santos Cunha
(que não sei se existe)
(...)
Há, no entanto, certos dias que se tornam
quase insuportáveis
Nesses eu pareço comigo mesmo
A segunda-feira amanheceu
de cara feia
batendo às portas
e acordando a todos
nervosamente.
Encheu os coletivos
de descontentes
entupiu as ruas de carros
e andantes apressados
A segunda-feira
estava naqueles dias
Na primeira viagem
estranhei não poder levar o açude
e os potes
Na segunda (...) tentei
levar o alpendre
Se realmente partires
podes levar o piano
(...) o abacateiro
e as três marias
Foi como se tivesse bateado durante a manhã inteira e me visse, agora, bem mais rico do que ao amanhecer.
/////