Saíra cedo do hotel depois de ter perdido tempo com uma recepcionista que errara a data. Trocara o 11 por 10 e o computador rejeitara. No final, digitou o 11 e o computador aceitou o cartão de crédito. Deu uma rápida passada defronte à sua fraternidade na Universidade de Harvard, que lhe trazia boas recordações. Tomou a estrada que ligava Cambridge, pela margem do Rio Charles, a Boston e divisou o prédio do M.I.T., onde terminara seu doutorado. Que saudades.
Hoje, era um executivo com laptop na pasta, celular, calhamaço de passagens aéreas e pouco lazer. Aos 32 anos, sentia que precisava emagrecer, queimar calorias, diminuir a ingestão de carboidratos e parar de tomar Pepsi, um vício antigo que lhe causara uma gastrite. Começaria a fazer ginástica nas férias de outubro, no Colorado.
Deixou o carro alugado no estacionamento da locadora e pagou a conta de US$ 111,11. Tomou a Van que o levaria ao balcão da American Airlines com destino a Los Angeles, do outro lado do país. Gostava de Los Angeles e do Hollywood Boulevard. Voltava a ser menino quando passava na calçada da fama. Recebeu o cartão de embarque e reparou que o número do voo era 11 e o lugar reservado 11-A. Olhou o relógio: 7:11h. Puxa, quanta coincidência!
A decolagem foi suave e o Boeing-767 fez uma ligeira curva para entrar em voo cruzeiro. Abriu a mesinha, colocou o laptop e esqueceu do mundo. Precisava concluir aquela negociação com os árabes endinheirados, que estavam comprando o controle de uma empresa de biotecnologia, assessorada por ele. Não gostava de árabes, mas aprendera, em Harvard, que dinheiro não tem pátria. Sabia que se negociasse bem poderia ser promovido em breve a vice-presidente. Faria o possível e o impossível. Estudara costumes árabes e sabia o ritmo certo de falar com eles. Tudo daria certo. Confiava no planejamento estratégico que elaborara com cuidado.
Recostou a cabeça e, por um breve instante, pensou em Glenda, sua ex-mulher. Tinha que tirá-la da cabeça e concentrar-se no negócio. Estava acostumado a disfarçar sentimentos desde que se divorciara no ano passado. Ela não suportara a sua ausência constante e a opção que fizera de não ter filhos com uma definitiva vasectomia. Estava livre, mas sentia o coração ainda preso. Quem sabe ela não aceitaria passar uns dias com ele em Vail no mês seguinte. Sem compromissos, é claro.
Concentrou-se no trabalho, recusou o que a comissária ofereceu, mas percebeu que o avião, ao invés de subir, perdia altitude. Tinha milhas e milhas de voo e isso o fez lembrar do poema de Robert Frost, que dizia: Eu tenho milhas e milhas a percorrer antes de dormir.
Levantou a cabeça e viu um movimento estranho à sua frente. Um homem estava na porta da cabine dos pilotos com o cenho franzido. O avião baixou mais e ele resolveu chamar a comissária para perguntar a razão. Apertou o botão acima de sua cabeça e a luz amarela permaneceu acesa, sem atendimento. Ouviu vozes alteradas, lembrando o sotaque dos árabes que encontraria no dia seguinte. O que estava acontecendo? Viu, num relance, um passageiro sendo esfaqueado duas poltronas à frente, enquanto o avião baixava mais e mais, sem diminuir a velocidade. Nuvens, no céu azul, passavam rápidas e rápidas. Sentiu pressão nos ouvidos. Divisou a Estátua da Liberdade, perdeu o equilíbrio, caiu, e não viu o World Trade Center.
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