Esta é uma história feita por faltas.
É por não haver uma mãe e é por não haver um amante que somos conduzidos pela mão de uma menina como a um violino, instrumento a que se dedica em seus dias de infância e que lhe dão a certeza de sua limitação.
Somos guiados por uma narradora que diz: “envelheci, e ainda tenho nove anos”.
Este é o primeiro de alguns jogos de espelhos dos quais se compõe esta Suíte de silêncios.
É com uma voz de criança, que descobre o mundo pela primeira vez, que Duína vai nos apresentando o fio desencapado de sua história. É pelo que não se diz que vamos adivinhando e construindo os roteiros possíveis da trama. Uma história adulta pelo olhar de uma menina.
Na outra direção, no lado de lá do espelho, temos uma Duína que interroga, que constrói um outro memorial, só que desta vez, da perda do homem amado, e o faz numa voz lírica, de alta voltagem poética, capaz de ver uma “manhã” que escorria “devagar do céu nacarado, lambendo vestígios da noite, tingindo de possível o nosso milagre”.
É possível, sim, inverter a sentença do poeta William Wordsworth que dizia: “o menino é o pai do homem” e, após ler Marília, pronunciar: “a menina é a mãe da mulher”.
Porém, nesta outra dança de espelhos, neste sequência de ponto e contraponto, de campo e contra campo, por mais que à primeira vista, o feminino grito, seja na voz da filha que reclama pela mãe, seja na amante que lamenta a perda do amado, Duína repete e continua o pai, ele também, e principalmente, um ser corroído pelo silêncio e abandonado pelo seu amor.
E que nós, ao nos abeiramos dos abismos dessa Duína, que faz de sua dor uma nota musical, imitemos uma de suas manias de menina, a de seguir, anonimamente, o caminho de pessoas estranhas.
Não seria esta a grande aventura narrativa? A de quereremos saber até onde vai o caminho dos outros?
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