O pensamento está no cerne da escrita, diz-nos Constantine François, conde de Volney, um desses homens que mais tem pensado.
Visionário
kantiano, autor de um catecismo contendo os princípios físicos de moral
extraídos da organização do homem e do universo, desejava que o seu livro – A Lei Natural – viesse a tornar-se de
leitura universal na Europa.
Sempre
me atraíram os pensadores e os moralistas que nos estimulam a pensar e,
sobretudo, a duvidar metodicamente, com paixão e constância, pois, afinal,
sensatez de espírito quer dizer retidão, preleciona o conde, acrescentando que
o preceito do Evangelho é o mesmo que o da natureza.
Não é
De Volney um escritor improvisado. Por isso, pode dizer:
Minha
fantasia, que se exalta no campo – escreveu –,
enlanguesce e sucumbe em casa, sob o madeiramento de um teto. Muitas vezes
tenho lamentado de que não existissem as dríades; asseguro que entre elas teria
querido fixar-me eu…
O
Conde, orientalista devotado ao estudo das religiões antigas, vasculha a cinza
dos legisladores e medita sobre a ciência dos séculos ao pé do deserto espaçoso
e triste, cemitério de cidades e povos desaparecidos e do homem que semelha aos
demais animais – privado de experiência do passado e sem previsão do futuro –,
órfão desamparado da potência não conhecida que lhe havia dado a vida; e que,
antes de domesticar o camelo, vagava pelas selvas guiado e regido por seus
instintos naturais.
Percorre
o conde uma terra arenosa e distante onde vagaram os primeiros homens pelas selvas
e margens dos rios, perseguindo as feras e os peixes, cercados de perigos e
acuados pela fome, pelos répteis, conhecendo suas fraquezas individuais,
movidos pela necessidade comum de viver seguros e pela recíproca consciência
dos próprios males, uniram seus meios e forças; e quando encontraram alguém em
perigo o ajudaram e socorreram os outros, quando faltou a um o alimento, lhe
deu outra parte da sua presa.
Hoje
o conde não é popular, embora tenha o seu culto por uma capela de leitores que
formam uma seita agnóstica. Porém, nunca em qualquer época foi a sabedoria
popular ou teve grande audiência, admitamos. Chegará o dia em que os leitores
formarão uma maçonaria secreta que se reunirá, em lugar não sabido e incerto,
para discutir e ruminar a leitura dos livros, artefatos considerados então de
alta periculosidade, quando exposto à curiosidade dos homens; condenados e
banidos pela tirania de plantão, como temos visto no curso da história.
Crê De Volney que a decadência se instala quando fica estabelecida a ociosidade sagrada no orbe político. É quando, progressivamente, abandonam-se os campos, ficam infecundas as terras, os impérios se despovoam, arruinando-se os monumentos; nessa circunstância, restam somente escombros do passado, enquanto passiva e precária a generalidade do povo aplaude os demagogos e os tiranos que Constantine François Chasseboeuf Boisgirais, o Conde de Volney, nascido no Anjou, em 1757 e falecido em Paris, em 1820, fustiga em A Lei Natural e em As Ruínas de Palmira, suas obras máximas.
Antevendo
o novo século – no Capítulo XV do que chamou de “catecismo do cidadão francês”
–, quando o povo recuperaria o seu poder, após se conscientizar de que ondas do
inumerável gentio abarrotavam o orbe, inunda as ruas e praças, por todo canto
ouvindo-se o grito: “Que novo privilégio é este?”
E
continua o conde visionário e moralista, escrevendo os seus pensamentos:
Somos uma populosa nação, e nos faltam braços, reitera o conde da tribuna do livro. Possuímos uma terra fecunda, e nos faltam víveres ou estão pela hora da morte. Somos ativos e laboriosos, e não temos o que comer. Pagamos enormes tributos, e nos dizem que são insuficientes. Estamos em paz com os de fora, e não estão seguras nossas pessoas nem nossas fazendas dentro de nossa própria casa. Que secreto inimigo é este que nos devora? E que envilece os bons com o servilismo?
Somos uma populosa nação, e nos faltam braços, reitera o conde da tribuna do livro. Possuímos uma terra fecunda, e nos faltam víveres ou estão pela hora da morte. Somos ativos e laboriosos, e não temos o que comer. Pagamos enormes tributos, e nos dizem que são insuficientes. Estamos em paz com os de fora, e não estão seguras nossas pessoas nem nossas fazendas dentro de nossa própria casa. Que secreto inimigo é este que nos devora? E que envilece os bons com o servilismo?
Um
criador devotado ao logos, à palavra, ao raciocínio, combate o Conde de Volney
a fama popular que se converteu em fato certo e deu corpo ao ser imaginário.
São questões que se colocam em A Lei
Natural através de princípios físicos de moral sacados da organização do
homem e do universo.
Em
seu humanismo militante, De Volney descreve um mundo racional regido por
preceitos e doutrinas que se conformam com a razão e o entendimento humano. Por
isto viveu e lutou o bom combate
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