“Se queres ser universal,
escreve sobre tua aldeia” (Tolstoi). E eu acrescento que se quiseres falar
sobre a alma humana, abre ao mundo a tua. E é isto que Daniel Barros consegue
em O sorriso da cachorra, um romance envolvente no qual apresenta ao leitor a
leveza e a fascinação apaixonada de dois jovens. Mas por trás desta delicadeza
temática existem dramas masculinos universais: o primeiro amor, o
deslumbramento, a dor, a decepção, a esperança que renasce, o fluxo do futuro e
o destino insondável que não respeita sonhos ou desejos.
Na história, Patrícia é a encarnação perfeita da alma de André, mas a
necessidade de autoafirmação masculina não o impede de fragmentá-la e dividi-la
em outros corpos e rostos. O tema do alcoolismo como elemento de suporte
emocional para a alegria e a tristeza também deixa transparecer a insegurança
juvenil que André procura superar de todas as formas para dar o melhor de si,
seja como estudante, seja como profissional e adulto.
Com forte cor local, o livro
caminha com o leitor pelo cenário das paisagens de Recife, e outras localidades
nordestinas, com suas praias, bares, rotinas e monumentos. Mas também tinge-se
de crítica social e política, mostrando o descaso com o trabalhador sertanejo e
a crueldade ‘senhores da cana” e da fome. Por tudo isto, considero este livro
com um daqueles que tem tudo para tocar profundamente aos leitores e se fazer
presente na memória por muito tempo, se não para toda vida – como bem o fazem
os romances universais.
*Fernanda Suhet: psicanalista e
escritora..
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