Escritor nascido no Ceará em 1945 e hoje radicado em Brasília, Nilto Maciel, depois da experiência de Itinerário (1974), surgiu-nos com o livro de contos Tempos de Mula Preta (1981), incursionou depois pela novela, com A Guerra da Donzela (1982), e volta agora ao conto, com Punhalzinho Cravado de Ódio (1986). Anuncia para muito breve um romance, Estaca Zero. Mas aqui desejamos falar é do contista, registrando as impressões que nos deixaram algumas de suas narrativas.
Em Tempos de Mula Preta, chamou-nos a atenção o conto de abertura do livro, “Ave-Marias”, onde encontramos a figura do Coronel Izidoro, “vermelho, peru enraivecido”, furioso porque sua filha, a Maria das Graças (ou Gracinha), anda de amores com o Carlinhos, filho do Dr. Pinheiro. O rapaz testemunha uma cena de lesbianismo entre Zefa e Maria, amante do Coronel: “Zefa derreou-se sobre Maria, beijando-lhe os seios, amassando-lhe o ventre, vigorosa.” O conto é estruturado em planos superpostos, mostrando-nos ora o Coronel a ralhar com a filha, ora Carlinhos lendo um romance no cabaré, ora Gracinha no banheiro, etc. Interessante é que nessa narrativa, de clima fortemente erótico, o romance que o personagem lê não é nenhuma obra naturalista de Júlio Ribeiro ou de Adolfo Caminha; não diz o narrador que livro é, nem há necessidade disso: “Livro aberto diante dos olhos parados, Carlinhos coça o queixo. ‘Abriram-se os braços do guerreiro adormecido e seus lábios; o nome da virgem ressoou docemente.’ “Ou, noutro passo: “Os pés de Carlinhos tremem no Chão luzidio da sala, as mãos agarram o livro antigo. ‘A juriti, que divaga pela floresta, ouve o terno arrulho do companheiro.’” Mas essas transcrições não são gratuitas, pois coincidem com a evolução do relacionamento do rapaz com Gracinha. Tanto assim que quando alguém pergunta a Carlinhos se sua mãe está, diz o narrador: “Ajeita-se, gagueja, fixa os olhos nas palavras. ‘Tupã já não tinha sua virgem na terra dos tabajaras.’” (Sabemos nós que todas as transcrições são do capítulo XV de Iracema, de Alencar.) O certo é que, enquanto o Coronel, cheio de ódio, espanca sua amante no cabaré, “Geme Maria das Graças no chão verde. Geme Carlinhos sobre o corpo róseo da moça. Os sinos da Matriz badalam seis vezes.”