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quarta-feira, 5 de julho de 2006

A ficção de Nilto Maciel (F. S. Nascimento)



1. O Jogo Verbal

Em seus mais recentes livros, Nilto Maciel tem se revelado um explorador irrequieto do estilo na prosa de ficção, justificando-se o interesse da crítica por algumas dessas bem sucedidas experiências. Partindo de consciente domínio do instrumental lingüístico, observa-se que esse procedimento vem se realizando dentro de um jogo verbal em que, usando os componentes da linguagem tal como estes se organizam no sistema expressivo convencional, subitamente o escritor rompe com esse eruditismo vernacular, definindo-se por arranjos estilísticos efetivamente representativos da sintaxe coloquial, em consonância com as variantes culturais dos seres projetados no espaço da ficção.

domingo, 2 de julho de 2006

Adeus, Alzira (Nilto Maciel)

(Alvaro Dias, autor da foto)



Cinquenta anos. Hã-hã. O pessoal brinca com isso. Quanto mais anos, mais lascado o homem. Muita vida passada. Muita água corrida debaixo da ponte. Os rios correm para o mar e se perdem nesse mundão. É a vida, a vida que se vai. A infância, a juventude, os bons anos. Muitos anos. Tempo que não acaba mais. Mas o que passou, passou. E eu vivi o quê? Metade da existência com essa jumenta. Uma égua, depois de velha. Não serve mais para nada. Faz tudo como antigamente. Só sabe abrir as pernas. No começo, um paraíso, parecia um nunca acabar de prazer, todas as noites, tudo numa paixão doida, num amor sem tamanho. Amor? Isso existiu de verdade ou foi só impressão? A gente falava de amor, amor, amor, jurava amar um ao outro para sempre, e nem notou que um dia essa palavra não valia mais nada. “Amor, você está bem? Boa-noite, amor”. Qual nada! Amor e bosta são uma coisa só. Basta puxar a descarga e vai tudo de esgoto abaixo. Agora, paixão existiu, aquele fogo danado dentro das carnes, queimando as tripas, agitando o corpo, aquele desejo animal, furioso, incontrolável.