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quinta-feira, 23 de novembro de 2006

Um novo homem (Nilto Maciel)



No dia de seu último natalício, Erialdo se viu agraciado com um pequeno cão. O presente saiu do coração solteirão de uma colega de sala. Por que diabos fulana presenteou-lhe aquela coisa viva? Bem podia ter pensado num acessório para o carro ou numa camisa.

Com o tempo, Erialdo se afeiçoou ao animal, a quem deu o nome de Ecce Homo, em homenagem ao seu antigo professor de latim.

terça-feira, 21 de novembro de 2006

De fantasmas e de favela: relatos (Hygia Calmon Ferreira)




Numa primeira abordagem de Estaca Zero de Nilto Maciel, a articulação interna do texto coloca o leitor diante de uma relação de tensão dialética entre a voz do narrador-personagem e as demais vozes. É assim que a ideologia subjacente se revela, implícita o explicitamente, através do dúplice discurso: de um lado, a figura do algoz/opressor/manipulador – a força, a persuasão, a ordem institucionalizada, o insulto, a imposição, o "sermão” –, da qual se fazem representantes Dr. Anísio Tanlares (o juiz), Dr. José Monte (o psiquiatra), Cordeiro Matos (o major), Luiz Rolim (o construtor e proprietário do terreno), Carlos Marinho (advogado do então comprador), Vicente (o tabelião), Seu Bernardo (o falso oprimido), Esmeraldo (o corretor) e, por extensão, a mulher deste, Violeta (a alienada); de outro, a figura do réu/oprimido/manipulado – o aniquilamento, aceitação, o caos, o silêncio do "sem voz", a submissão, o discurso fragmentado e por vezes ilógico de Cesário Valverde, anterior dono da favela Estaca Zero. Josefina, a irmã, é o ser alheio que se manifesta parcamente através de rezas, resmungos e cochichos.