Começo de madrugada. Cachorros ladram. Um burburinho chega da vizinhança. Agora um vento frio entra pela clarabóia. De quando em vez um galo canta, e espera a resposta dos outros. Um soluço corta o silêncio na casa ao lado: alguém chora um antigo amor? Um pai lamenta o destino da filha? Ao longe uma sirene, bem mais distante um sino toca. Seria já manhã? Ou todos os ruídos da noite confluíam para aquele quarto simples de subúrbio: todos os lamentos perdidos, súplicas vãs, soluços de arrependimento ecoavam pelas paredes, farfalhavam entre as folhas da acácia, resvalavam nas frestas da persiana — um milhão de minutos pingava no relógio da sala: os rostos dos familiares mortos ganhavam uma nitidez surpreendente. Outro galo confirmava a madrugada, a mesma madrugada de outras épocas, como aquela em que amarraram o bêbado Napoleão no centro da praça — merecido castigo por seu misterioso crime — quando se fecharam todas as janelas: menos uma, logo aquela... a culpada de tudo. Um grilo agora eternizava a madrugada, fazendo com que a manhã fosse uma esperança perdida, um sonho que nunca se realizaria.
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