Quando ele voltou, isto é, quando o trouxeram de volta, não o reconheci. Talvez eu já estivesse ficando cega, caduca, velha demais, como diziam. Não, meu filho parecia mesmo outro. Certamente haviam passado muitos anos desde sua partida, pois ele também não me reconheceu. E nem ainda me reconhece.
No quintal, mete-se na água suja que escorre da lavanderia, na lama formada ao pé do mamoeiro ou no lixo onde se amontoam os restos de comida reservados ao bacorim desaparecido.
Dia desses, a vizinha da direita, ao ouvir aquele remexido na água, pôs a cabeça sobre o muro e perguntou se me haviam devolvido o porco. Enquanto imaginava a resposta, perguntei-lhe se do lado de lá o muro era baixo. Fui buscar um tamborete, porque julguei ter ouvido roncos de porco, explicou-me. A seguir, arregalou os olhos e perguntou: de quem é este sapão? Você está criando ele para engolir cobras? João olhou para a cabeça que falava e deu uns três pulinhos dentro da água. Tive vontade de dizer um desaforo qualquer. Terminei fazendo graça. Eu o queria para apagar brasas. A safada sorriu e disse: deixe de mentira! Ninguém usa mais fogão a lenha nem fogareiro a carvão. E desapareceu. Fiquei apalermada, a olhar para cima do muro. E ainda ouvi a voz risonha e sumida da vizinha gritar: jogue água salgada nas costas dele.
Dias depois, minha vizinha da esquerda veio me perguntar se, na verdade, eu havia resolvido criar batráquios. Ora, que diabo são batráquios? Quando tiver alguma jia grande me avise. Adoro jias.
Hoje me contaram tudo: meu filho esteve numa solitária, acocorado durante não sei quanto tempo.
(26/5/77)
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