Com Os Luzeiros do Mundo, Nilto Maciel ganha o primeiro lugar no Concurso Graciliano Ramos de romance (1992/93), promovido pelo governo do Estado de Alagoas. “Autor versátil e de grandes recursos estilísticos”, Nilto Maciel já tem, publicados, romances – A Última Noite de Helena, A Rosa Gótica, Os Varões de Palma; novela – A Guerra da Donzela; contos – Tempos de Mula Preta, Pescoço de Girafa na Poeira; poemas – Navegador. Nilto Maciel é um escritor múltiplo. “Não é só um escritor. Além de um bom escritor e de um imprescindível articulador literário, é o artista da palavra que sabe compreender e assimilar os avanços estilísticos de seu tempo...” São palavras adequadas e elucidativas, de João Carlos Taveira.
Nos dois primeiros parágrafos de Os Luzeiros do Mundo situa-se o cenário (a casa de Thaumaturgo), com detalhes, mas com expressividade. Aos poucos, vai dispondo os personagens, com suas idéias e sonhos (sonho unionista e pré-sebastianista, sonho lusitano de um amor eterno e ideal). Aqui e ali, o Autor vai enumerando outros personagens curiosos e o romance vai se adensando no seu conteúdo mental e humano. Vão se desenrolando mais personagens com suas ideologias cegas e radicais; com suas adivinhações e horóscopos. São personagens que conversam com os mortos, trazem mensagens que são traduzidas em cabarés e em meio à bebedeira. Com seu anticomunismo radical e doentio. São personagens percebidas em função de seus atributos e de suas idéias. Lá está o carteiro, que só entrega carta – esquisitice e mistério – suspeito de assassinato. Lá está o indivíduo – Nicanor – a quem cabia dar as informações mais secretas. Sabia o nome dos viventes da cidade – Palma – até dos gatos, cachorros, galos. (Parece que não havia briga de galo...) O delegado sentia-se o mais capaz de todos os habitantes, sobremaneira, em matéria criminal. Um Sherlock Holmes de Palma. A descrença do vigário do mágico que dizia conhecer os segredos da mente, mas de quinta categoria.
Há de tudo em Os Luzeiros do Mundo: comunista, anticomunista radical, detetive, bêbado, hipnotizador, mágico, carteiro, herói, adivinho, prostituta, movimentos, sedição, consultor de horóscopo, que se vão definindo à medida que falam, que dizem os planos, o que pensam em reunião, em casa, na cama, no cabaré. Destaque-se a dose de humor e ironia que sobrecarregam, de graça e curiosidade, o romance.
Há sim muita conversa e diálogo em Os Luzeiros do Mundo. Entretanto, como não existem os sinais convencionais gramaticais do discurso direto (o travessão), o leitor precisa estar atento à leitura. Nilto Maciel usa dois pontos (:) para esclarecer o diálogo. É um recurso ou uma prática nesse livro que prende a atenção do leitor, em quase todas as páginas.
Sem esforço, contudo, o leitor sente a presença do interlocutor, após os dois pontos. Daí a repetição do discurso indireto livre, pois aí se verifica uma simbiose ou inserção da fala dos personagens no próprio relato do narrador, que comunga com a emoção ou pensamento, avaliando e aprovando a reação dos personagens. Isso é um traço marcante na obra de Nilto Maciel. Em verdade: em Os Luzeiros do Mundo, o leitor não vai encontrar – só muito raramente – os desvios estilísticos de efeito nem também o lugar-comum, “sem jogo de palavras ou de espelhos, mas competência de um estilista que funde humor, surrealismo fantástico...” Nesse livro, permeia-se um itinerário multifacetado, como se o Autor inventariasse o fantástico, o absurdo, o escaninho mais fragmentário de nossos estranhos surtos de imaginação, nos moldes de José J. Veiga, de um Juan Rulfo, de um Gabriel Garcia Marquez, de um José Cândido de Carvalho ou de Murilo Rubião – escreve Ronaldo Cagiano.
(Jornal Binóculo nº 56, Fortaleza, janeiro, 2006)
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