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terça-feira, 26 de agosto de 2008

"Não me sinto acadêmico, sempre fui marginal".


(Entrevista concedida por Nilto Maciel a Cissa de Oliveira)

Cissa de Oliveira – Consta na sua bibliografia que o seu primeiro livro foi publicado em 1974. Você se descobriu escritor por volta dessa época ou já escrevia muito antes de 1974?
Nilto Maciel – Leio desde menino e desde adolescente passei a imitar os escritores. Claro que nada daqueles escritos valia alguma coisa. Na verdade, o que sobrou (joguei quase tudo no lixo) foi um conjunto de 14 contos curtos que publiquei em 74 sob o título "Itinerário", depois reescrito e republicado.

CO – Nilto, qual é, na sua opinião, o papel do escritor na evolução da linguagem?
NM – Cissa, está nos livros: tudo existe por necessidade. Nada se cria para ser inutilidade. Mesmo aquilo que alguns (ou a maioria) abominam. Vejamos as drogas orgânicas: como viver sem elas? No mundo todo, o álcool é usado diariamente. A linguagem também se cria ou se recria continuamente, por necessidade de comunicação.

CO – Dizem que a mesma droga pode ser veneno ou remédio, dependendo da dose. Quanto à “química literária”, a sua, por exemplo, que é viciadora (gostou do palavreado?) – é sim... - é passível de ser aprendida ou somente apreendida? Será que os novos escritores aprendem a escrever, e isto seria algo mais relacionado com a prática e a leitura ou o talento é o que conta?
NM – Aprendemos sempre, se quisermos. Para apreender, no entanto, é preciso mais do que vontade. Existe uma faculdade do escritor no Rio Grande do Sul. Não sei como funciona. Acredito que todo bom aluno (aplicado, como se dizia) pode aprender a escrever bem. Claro que a escola (os professores) contará com a prática da escrita e a leitura. Sem isso, impossível escrever. Não sei se sem talento (ou dom, seja lá qual for o nome) seja possível alguém se tornar um bom escritor. Acho que não. Muita imaginação, curiosidade, ousadia, tudo isso é necessário. Essencial, direi.

CO – A cidade de Palma. Quando você criou um carnaval por lá (Carnavalha) foi para dizer algo que teria deixado de expressar em “Os Varões de Palma”? O que há de especial com esta cidade?
NM – Nem sei como surgiu a idéia do romance. Creio que tenha bebido um bocado de cerveja, nos dias de carnaval de 1997 ou logo após. Fiz um balanço: escrevi um romance que remonta aos tempos coloniais (Os Guerreiros de Monte-mor), outros que relembram os primeiros anos do século XX, um que conta 1964 em Palma. Faltava um romance de hoje. Palma seria a Baturité de minha infância e de antes dela. Tudo imaginado, é claro, porque não faço pesquisas para escrever. Minto: faço pesquisas, sim, leio muito, li muito sobre índios, História do Brasil, do Ceará, de Baturité, folclore, estudos sociológicos, etc.

CO – Ainda sobre Carnavalha: O Carnaval foi escolhido como tema por ser um pano de fundo ideal, onde pessoas e fatos se transmutam com mais naturalidade, permissividade, tolerância?
NM – Não, não pensei nisso. Como disse na resposta anterior, a cerveja me fez pensar num romance em pleno carnaval.

CO – “A cerveja me fez pensar num romance em pleno carnaval”. Pois bem, eu soube de escritores que se acostumaram a escrever poemas somente a partir de citações de outros poetas; e há aqueles que só escrevem se for com o uso do computador, e outros que o fazem até durante o transporte diário. Qual é a sua metodologia para escrever? Há algum pré-requisito? A inspiração é essencial ou você começa e depois deixa que a coisa vá acontecendo?
NM – Meus primeiros escritos saíram em folhas de papel ou cadernos. Só recentemente passei a escrever diretamente na tela do computador. Coisa de dez anos. A idéia surge a qualquer hora e em qualquer lugar: vendo televisão, ouvindo música, dirigindo carro, trabalhando, etc. Então anoto a idéia e passo a desenvolvê-la em pensamento. Não deixo "a coisa acontecer ou ir acontecendo". Fico ruminando por horas e dias aquela idéia. E vou anotando tudo. Às vezes nem consigo dormir direito, a noite toda "pensando" naquilo. Chego a escrever, a elaborar o conto durante o sono. Decoro as frases, refaço-as mentalmente. No outro dia tenho tudo decorado e copio. Só então (pronto o conto) passo à fase de lapidação: cortes, acréscimos, troca de vocábulos, nomes de personagens, etc.

CO – E já que falamos em computador, você acha que o livro impresso ainda será substituído pelos livros eletrônicos? Dentre os seus livros impressos,
quantas e quais obras já estão editadas digitalmente?
NM – Sim, um dia os livros de papel serão substituídos pelos livros eletrônicos. Já existe isso em escolas. Nos tribunais os autos estão desaparecendo. Tudo no computador. Todos os meus livros estão em disquetes, cds, sites e blogs.

CO – Então, diante da eminência do fim do livro impresso, não seria lógico que as editoras abrissem mais espaço e condições para a publicação de novos autores, sob o risco de desaparecerem?
NM – Não sei o que pensam os editores sobre isto. Certamente pensam em ganhar muito dinheiro, antes do fim da era do livro impresso. Porque depois pensarão em ganhar dinheiro noutros quintais.

CO – Eu notei que você é um autor que tem sido bem estudado e imagino que isto traga bastante satisfação. Dentre esses estudos existe algum que tenha um significado especial pra você?
NM – É verdade, muitos têm escrito artigos sobre minha obra. Alguns são amigos e, portanto, o fizeram por amizade. Outros são apenas conhecidos. E há ainda os que nunca vi ou com eles conversei. Todos os artigos são agradáveis. Mas posso mencionar dois como importantes para mim: o prefácio de José Lemos Monteiro para o romance A Guerra da Donzela e um estudo de F. S. Nascimento (F.S. Nascimento reuniu os três estudos num só e publicou em livro, “Apologia de Augusto dos Anjos e outros estudos” – Universidade Federal
o Ceará/Casa de José de Alencar, Fortaleza, Ceará, 1990).

CO – O que você fez em termos de política e em que períodos? O que escreveu neste meio tempo?
NM – Fiz-me socialista aos 15 anos de idade, mais ou menos. Depois de ter decorado a missa em latim e de lido todas as orações da Igreja Católica, passei a ler os hereges. Li muitos filósofos. E assim me fui tornando ateu ou seja lá o que for. Logo me fiz leitor dos semanários de esquerda: A Liga (de Francisco Julião, das Ligas Camponesas), A Classe Operária, Novos Rumos (PCB) e outros. Lia também revistas e livros de esquerda. Em 63/64 participei de um grupo de bairro (meus irmãos e uns amigos) chamado LACISA - Liga de Ação Contra a Injustiça Social e Administrativa, desfeita com o golpe. Retornei à luta em 67, no CESC - Centro dos Estudantes Secundaristas do Ceará - então sob o controle de um grupo chamado Quarta Internacional Trotskista ou Partido Operário Revolucionário Trotskista. Com a intensificação da repressão e o início da luta armada (guerrilha urbana e rural), voltei-me de novo para os estudos e a literatura.

CO – Poesia. Além de um livro de poemas, "Navegador", de 1996, e algumas participações em antologias deste gênero, você não tem publicações em poesia, apesar de ser um autor de vários livros de conto e romances. Como o autor Nilto Maciel enxerga a poesia que se produz hoje no Brasil?
NM – Li muita poesia. Os principais poetas. Hoje leio pouco. Não conheço os novos poetas. Há anos não escrevo poemas. Os bons poetas de hoje, para mim, são aqueles que li há trinta, vinte, dez anos, como Francisco Carvalho, Ferreira Gullar.

CO – O que você está escrevendo atualmente? Você escreve mais de um livro numa mesma época?
NM – De vez em quando escrevo um conto. Aqui e ali, um artigo, um prefácio, a pedido. Romance não pretendo mais escrever. Quando escrevia romances, dedicava meu tempo todo somente a eles. Os contos não são programados. Vão surgindo, vou anotando.

CO – Nilto, se você tivesse que escolher dentre as suas obras uma que melhor representasse todo o seu trajeto literário, qual delas seria?
NM – Talvez "A guerra da donzela".

CO – Você acredita que o hábito da leitura poderia ser afetado pela diversidade de atividades que se pode ter hoje em termos de diversão ou o público que gosta de leitura é diferenciado neste sentido?
NM – No passado (que não conhecemos), num tempo sem rádio, sem televisão, sem computador, sem cinema, quem gostava de arte lia e freqüentava teatro. Hoje, diante de tantas opções de diversão, as pessoas se afastam dos livros. Na verdade, os leitores são uma minoria. Sempre foram. Mas o leitor não troca livro por televisão.

CO – O ambiente onde se escreve tem muita influência sobre o que se escreve? Como é isto pra você?
NM – O ambiente influi muito no momento da criação literária. Prefiro escrever em silêncio, na solidão, com muitos livros por perto (dicionários, principalmente), com saúde, lúcido, tudo limpo e arrumado. Uma só pessoa no ambiente atrapalha. Insetos atrapalham. Ruídos atrapalham.

CO – Nilto, o seu artigo “A respeito da Revista O Saco” no Portal de Arte e Literatura Cronópios (http://www.cronopios.com.br/site/artigos.asp?id=3318), de 12.06.08, é um verdadeiro histórico que delineia as batalhas e também o sucesso desta antiga revista literária. Você, que foi um dos fundadores e fazia parte do conselho editorial, a que atribuiria o marcante sucesso da revista em tão pouco tempo (menos de um ano de edição)?
NM – Aquele momento - 1976 - se mostrava propício ao surgimento de novas propostas editoriais. Além disso, éramos muito ativos, combatentes, decididos, jovens. Porém, não fosse Manuel Coelho Raposo, a revista não teria surgido e existido.

CO – Por que a edição da Revista O Saco acabou, mesmo num momento de muito sucesso e prestígio literário, inclusive no exterior? Foi falta de alguma espécie de apoio? De que tipo?
NM – A revista acabou porque tudo acaba. Não, estou filosofando. Acabou porque houve pressão da distribuidora: ou aumentávamos a tiragem ou o contrato chegaria ao fim. Como não tínhamos muito dinheiro, não foi possível aumentar a tiragem. Por outro lado, Raposo deve ter se sentido cansado. Naquele tempo não queríamos apoio estatal (vivíamos sob a ditadura).

CO – Por que a revista recebeu este nome? Sempre cabia mais um (escritor) ou é porque ali, na medida em que ligados pela literatura, todos eram farinha do mesmo saco?
NM – Não, todos não eram farinha do mesmo saco. Publicávamos antigos e novos, cearenses e sulistas, moderninhos e tradicionalistas. O importante era o valor literário. O nome veio do formato: um envelope amarelo (tipo saco) como capa.

CO – Você edita deste 1991 a revista Literatura, portanto, há um bom espaço de tempo. Algum dos seus colegas escritores fundadores da antiga Revista O Saco trabalha com você neste novo (maneira de dizer) veículo literário?
NM – Na verdade, 17 anos. Todos os amigos que fiz desde o início dos anos 1970, de todo o Brasil, continuaram amigos e colaboradores. Alguns nunca cheguei a ver. Outros vi uma vez na vida. Mas nada disso impede a amizade. Literatura é uma revista feita por amigos. Citarei apenas alguns, por economia de espaço: Enéas Athanázio (de Santa Catarina), Francisco Miguel de Moura (do Piauí), Batista de Lima (do Ceará). São os mais antigos. Surgiram outros, é claro. E sempre surgirão, porque na família dos escritores há brigas, desavenças, invejas, ciúmes, mas todos se amam.

CO – Fale um pouco sobre a Revista Literatura. Tem alguma espécie de patrocínio para a edição, distribuição, etc, como acontecia com a revista O Saco? A periodicidade de publicação da mesma mudou desde o começo ou sempre foi semestral? Passado o tempo, quais foram e quais são as suas expectativas para esta revista?
NM – A grande diferença entre O Saco e Literatura está exatamente no patrocínio. Aquela contava com anúncios comerciais; esta vive da colaboração de seus fundadores, basicamente. Não tem anúncios, não recebe patrocínio oficial ou empresarial. A distribuição é dirigida a bibliotecas, entidades culturais, jornalistas da área cultural, escritores, etc. A periodicidade tem se mantido na semestralidade, com muito esforço de todos nós. Já pensei em dar fim à revista. Estou cansado. Muita chateação. Muita gente querendo publicar e poucos querendo ajudar.

CO – Revista O Saco, revista Literatura, Caos Portátil. A sensação que eu tenho é a de que no Ceará existe uma preocupação suficientemente forte para driblar as dificuldades e a inércia em termos de publicação, abrindo cada vez mais espaços para os autores. Existe mais algum periódico literário editado atualmente no Ceará além da Literatura e Caos Portátil?
NM – Batista de Lima escreveu um artigo sobre este assunto: é grande a tradição de periódicos literários no Ceará, desde o século XIX. Talvez a explicação esteja no abandono a que somos relegados pelas editoras do Sudeste. Entretanto, não somos apenas os cearenses estes esquecidos.

CO – Aí está uma resposta (literária) bastante construtiva, em perfeita consonância com os tempos da internet onde “fronteira” é palavra que não existe. Falando nisto, em quais principais endereços eletrônicos (sites, blogues, etc.) se podem encontrar alguns dos seus escritos?
NM – É verdade, com a Internet acabaram-se as fronteiras. As pessoas nem querem saber onde você mora, se o vêem num site ou num blog. Tenho conhecido escritores de todo o Brasil (o que já acontecia, porque sempre fui um buscador de amizades e novidades). Meus poemas, contos, romances, artigos estão nos seguintes endereços (e noutros):
http://literaturasemfronteiras.blogspot.com/ http://niltomaciel.blog.uol.com.br/ http://contosbrasileiros.blogspot.com/. http://www.cronopios.com.br/ http://www.secrel.com.br/jpoesia; http://www.verdestrigos.org/; http://www.bestiario.com.br/; http://www.germinaliteratura.com.br/ http://www.antoniomiranda.com.br/ http://www.revistavagalume.com/. http://www.conexaomaringa.com/. http://www.literaturafantastica.pro.br/

CO – Por causa do trabalho você morou em Brasília por mais de vinte anos e depois voltou para o Ceará. Em Brasília não tinha disso não?
NM – Em Brasília tem também um pouco de Ceará, de Nordeste, como em São Paulo e Rio de Janeiro. Entretanto, lá eu me sentia em exílio. Muita saudade da gente, dos costumes, da cultura cearenses.

CO – O escritor Nilto Maciel se delineia nestas respostas, mas e o Nilto pessoa, o que me diz dele? Fale um pouco sobre a sua família, e da sua relação com eles.
NM – Tenho quatro filhas: Fernanda Carenina, Menita Flaviana, Nioche Valentina e Aretusa Luanda. Meus quatro amores. Meus pais já faleceram. Meus primeiros amores. Restam-me duas irmãs. Segundos amores. Falo com elas todo dia, por telefone, porque moram fora do Ceará, as filhas e uma irmã.

CO – É sabido que, paralelo à carreira profissional, surgiu e cresceu o escritor Nilto Maciel, exemplo que se vê entre vários escritores bem reconhecidos. Será que “viver de literatura” é tão prazeroso quanto exercê-la pelo simples fato de gostar de escrever?
NM – Não se vive de Literatura, no Brasil. A maioria dos escritores (creio que no mundo todo) escreve por prazer, por vaidade, por isso, por aquilo, e não porque ganha dinheiro com ela. Alguns de meus livros foram editados por editoras de porte médio, em edições pequenas. Ou por editoras oficiais (secretarias de cultura). O maior prazer está, no entanto, em escrever, criar. Sinto-me entediado quando não estou escrevendo. Quando a centelha surge, a alegria vem junta. Nesse momento tudo desaparece diante de mim. Entro em transe. Tudo o mais ao meu redor deixa de existir: até a música de Chopin. Se alguém me visitar nesse momento, certamente não será recebido com cortesia. Se alguém me telefonar, não atenderei o chamado. Passo o resto da noite a pensar e fazer anotações. Não consigo dormir direito. Sonho com o conto em processo de criação. Às vezes escrevo (mentalmente) dormindo. No outro dia tenho tudo decorado e é só copiar.

CO – E então, Nilto, quais são as novidades em termos de lançamentos literários? Algum projeto em especial?
NM – Caríssima amiga Cissa, como só paramos quando morremos, eu também continuo escrevendo e publicando. Só espero não continuar escrevendo depois de morto. Mas quero continuar publicando, isto é, sendo publicado. Além da antologia “Capitu mandou flores” (Geração Editorial, SP) organizada por Rinaldo de Fernandes, deve ser publicado em breve o ensaio sobre o conto cearense. Pretendo publicar até outubro o n° 35 da revista Literatura. E no começo do ano vindouro mais uma coleção de contos: Urbi et orbi, contos curtos, escritos há alguns anos.

CO – O que significa “Urbi et orbi” (é relacionado à cidade?) Os contos seriam relacionados ao cotidiano citadino?
NM – "Urbi et orbi" é o título de um dos contos. São contos curtos, de personagens históricos, mas nem sempre urbanos. Como se sabe, a expressão latina e católica "urbi et orbi" quer dizer "À Urbe (= Roma) e ao mundo".

CO – Nilto, uma das coisas mais poéticas que eu li ultimamente não estava num poema, mas num comentário que você escreveu em “Livros do Brasil”*. Ali você escreve sobre a “rica indústria do livro no Brasil” e que ela atuaria em três principais frentes: 1) do livro didático; 2) do livro das grandes, médias e pequenas editoras; e 3) a do livro do autor ou micro-editora de autor. Com relação ao último tipo (3), eu pergunto: Na sua opinião, que coisa é esta que faz um escritor passar por cima de tantos obstáculos para publicar?
* (11.10.05 no seu blogue
http://niltomaciel.blog.uol.com.br/arch2005-10-09_2005-10-15.html).

NM – Como se sabe, as editoras só publicam estrangeiros (santo de casa não faz milagre) e alguns brasileiros. De preferência, jornalistas, cronistas de grandes jornais, "famosos" (como dizem por aí), porque são garantia de venda dos livros. Ou seja, o investimento do editor dá bom resultado. O resto (a literatura propriamente dita) fica de fora do mercado. Sendo assim, os escritores se vêem forçados a pagar as pequenas edições de seus livros. Vendem dez, vinte exemplares na noite de lançamento (para parentes e amigos) e o resto da tiragem vai para casa. Parece coisa de louco, de criança, de visionário, de poeta, não é? Alguns, depois de mortos, virarão celebridades no meio acadêmico (como o cearense Oliveira Paiva) e seus livros serão editados por grandes editoras, que não pagarão direitos autorais a ninguém (deviam pagar a um fundo de cultura).

CO – Ainda em “Livros do Brasil” você diz que os livros da terceira frente, os “do autor”, terminariam, felizmente, nas mãos dos melhores leitores e pesquisadores. Isto é uma alusão de que estes livros não seriam apenas “achados”, mas procurados? Como é isto?
NM – Em prosseguimento à resposta anterior: alguns não se tornarão logo celebridades nacionais (Moreira Campos, por exemplo), mas terão o reconhecimento de críticos e leitores mais exigentes, e seus livros (tornados raridades) serão procurados em sebos.

CO – Você diz também que foi para este tipo de livro que nasceu a Revista Literatura. Isto me diz da sua preocupação em levar ao público grande parte do que se produz em termos literários no Brasil, mas que fica no escuro. Você acredita que se mais escritores se unissem para mostrar não apenas as suas obras, mas também as dos demais, as editoras poderiam rever a questão do domínio em relação ao mercado editorial?
NM – Nós escritores brasileiros temos o dever de divulgar uns aos outros. A Revista Literatura nasceu para isto. Nunca publiquei figuras do baralho midiático. Nem eles precisam disso. Nem sequer sabem da minha existência ou da revista. Não importa. Se os editores vão mudar, não sei. Talvez não mudem nunca.

CO – Você é membro da Academia de Letras e Artes do Nordeste/Ceará, que edita a Revista Urupema. Também é membro da Academia de Letras do Brasil, em Brasília. Fora isto, é um autor reconhecido, preservando as diferenças de categorias literárias, um Ariano Suassuna do Ceará. Vocês são amigos? Quem são os seus pares mais próximos em termos de convivência?
NM – Sim, sou membro de duas academias, convidado que fui para integrar-me a elas. Muito a contragosto, porque não me sinto acadêmico. Sempre fui marginal. Não tenho editores, não estou na mídia, não tenho amigos influentes, etc. Longe de mim ser um Ariano Suassuna. Ele está muitos degraus acima. Estou no patamar mais baixo. Mas não tenho inveja de ninguém. E desejo muito sucesso para todos. Como a João Ubaldo Ribeiro, que acaba de ganhar o importante Prêmio Camões. Louvor a ele, que merece todos os prêmios. Conheço um bocado de gente pelo Brasil a fora. A maioria só por carta, telefone, internet. Em Fortaleza me relaciono muito bem com todos os escritores, sejam mais velhos, como Francisco Carvalho, um dos maiores poetas do Brasil, sejam mais jovens, como Tércia Montenegro, belíssima contista.

CO – Eu fiquei impressionada com a quantidade de livros e citações envolvidas no seu estudo "Panorama do Conto Cearense". Você fez este longo estudo por achar que os registros anteriores eram poucos, dispersos, incompletos, para atualizar ou o que?
NM – Eu conhecia dois estudos excelentes sobre o conto cearense, de Braga Montenegro e de Sânzio de Azevedo. Além de artigos e resenhas diversas. Nenhum livro, porém, dedicado exclusivamente ao conto cearense. Este foi o motivo que me levou a pesquisar e escrever o "Panorama". Nenhuma pretensão de melhorar nada. Porque não se pode melhorar o que é melhor. Braga é (faleceu há alguns anos) um dos mais profundos estudiosos da literatura cearense, brasileira e universal no Ceará. Sânzio é doutor em Letras, pesquisador sério e dedicado. Sabe tudo e mais alguma coisa de Literatura Cearense. E também de Parnasianismo. Estou muito longe deles. Sou um aprendiz.

CO – Nilto, o que você gostaria de nos dizer que eu não perguntei?
NM – Acho que não há mais nada a dizer. Ainda bem que você não fez perguntas indiscretas. Se tivesse feito, eu não as responderia. Não gosto de falar de mim, de meus defeitos, de meus pecados. Por isso não escrevo mais diários. Minhas memórias estão em meus contos e romances. Estou neles. Um pouco, é claro.

CO – Digamos que eu não goste de ser (muito) indiscreta (risos), e que eu procurei não seguir alguns vieses na nossa conversa por ter intuído que você teria se aprofundado neles se assim o quisesse.
Muito obrigada, Nilto, tanto por nos presentear com a sua maravilhosa “química literária” quanto por se permitir delinear um pouco mais através desta entrevista.

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Nilto Maciel (Baturité, 1945) é um dos fundadores de O Saco. Publicou as seguintes coleções de contos: Itinerário, 1.ª ed. 1974, 2.ª ed. 1990, João Scortecci Editora, São Paulo, SP; Tempos de Mula Preta, 1.ª ed. 1981, Secretaria da Cultura do Ceará; 2.ª ed. 2000, Papel Virtual Editora, Rio de Janeiro, RJ; Punhalzinho Cravado de Ódio, 1986, Secretaria da Cultura do Ceará.; As Insolentes Patas do Cão, 1991, João Scortecci Editora, São Paulo, SP; Babel, 1997, Editora Códice, Brasília; Pescoço de Girafa na Poeira, 1999, Secretaria de Cultura do Distrito Federal/Bárbara Bela Editora Gráfica, Brasília; e A Leste da Morte A Leste da Morte, 2006, Editora Bestiário, Porto Alegre, RS. Tem novelas, romances e poemas em livros. Pertenceu ao Grupo Siriará. Editor, desde 1991, em Brasília, da revista Literatura. Em 2003 a transferiu para Fortaleza. Suas narrativas mereceram artigos e ensaios de alguns comentaristas e críticos cearenses, como F. S. Nascimento, Sânzio de Azevedo, Dimas Macedo, Batista de Lima, Francisco Carvalho, Caio Porfírio Carneiro, Carlos Augusto Viana, e também de outros Estados, como Foed Castro Chamma, Tanussi Cardoso, Francisco Miguel de Moura, Ronaldo Cagiano e Astrid Cabral. Tem contos traduzidos para o espanhol, o italiano e o esperanto. Ganhou alguns prêmios também no gênero conto. E-mail: niltomaciel@uol.com.br

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Cissa de Oliveira é o pseudônimo literário de Maria Sileuda Moreira de Oliveira que é cearense e moradora em Campinas – SP. É bióloga, doutora em Genética e Biologia Molecular e atua na área da Saúde e da Educação. A autora, que se dedica à escrita desde o ano de 2000, foi premiada com a publicação do seu livro de crônicas “A pontinha das páginas” (2007) no concurso “Prêmios Literários Cidade de Manaus”. Além de possuir livros de poesias, crônicas e infantis registrados na Biblioteca Nacional (inéditos) a autora participou de oito antologias no Brasil e no exterior, a mais recente, “Dez Rostos da Poesia Lusófona”, lançamento na 20ª. Bienal Internacional do Livro em São Paulo, 2008.

(Agosto de 2008)
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quinta-feira, 21 de agosto de 2008

O ativista (Marcelo Spalding)



A crônica de uma pequena cidade do interior do estado precursor da liberdade conta que há remotos tempos vivera ali um certo ativista, o primeiro do gênero que se tem notícias. E último. Ocorre que a cidade era conhecida de norte a sul do país como a cidade onde o ar era mais fresco, digamos assim. Programas de rádionovela repetiam piadas, vizinhos tripudiavam e a fama cresceu à revelia de seus honrados cidadãos e apavorados governantes. Tudo isso explicava o ilustre doutor Simão Brutamontes, ativista da moral e dos bons costumes contratado especialmente para reestabelecer a ordem na pequena cidade. – A saúde da alma é a ocupação mais digna de um médico, bradou Simão enquanto olhava suas cartas em busca de uma rainha.
– E a honradez da cidade é a ocupação mais digna de um homem público, exultou Crispim, o vereador, sem notar que o doutor baixava uma canastra quase completa. – Alto lá, doutor, este cinco não é de paus, preste atenção, protestou o boticário, atento ao jogo e às moedas sobre a mesa.
– Queres que eu te dê um de paus, Simãozino?, ironizou Soares, o vendeiro.
– Ora essa, estás me confundindo?
Riram todos, riu o vereador, riu o boticário, riu o vendeiro e riu o doutor. Riram e coçaram as barbas espessas, afinal desde que Simão chegara na cidade todos faziam questão de cultivar barba, bigode e os mais radicais sequer usavam perfume ou desodorante. Mas naquela tarde a partida não terminou, Simão era chamado com urgência no gabinete do prefeito. O ativista entrou sem pedir licença, cumprimentou o prefeito com um aperto de mão forte porém rápido e acomodou-se numa bela poltrona. O outro contou uma longa história sobre a formação da cidade, a importância da educação européia para as primeiras gerações, a pujança cultural e econômica dos anos idos para finalmente confessar que vira seu filho ao telefone – e de risinhos – com um amigo.
– Mas se foi por pouco tempo isso é normal, tentou contemporizar Simão.
– Por duas horas.
O doutor jogou-se para trás na poltrona, suspirou, coçou a barba e ensaiou uma longa explanação sobre ciência, moral e sexualidade, sobre a importância de mantermos os jovens longe das más companhias, evitando assim uma “deturpação formativa irreversível”. Encerrou o discurso suando e exalando um cheiro ruim o suficiente para que o prefeito abrisse as janelas. Voltando à sua cadeira, perguntou:
– O que então o senhor sugere, Doutor Simão?
– Sugiro a ampliação imediata da Casa Rosa, digo, da Casa Verde a fim de tratarmos também os doentes potenciais, aqueles que ainda não praticaram algum ato de, bem, o senhor sabe, mas estão em vias de praticá-lo.
A Casa Verde foi o nome dado ao asilo, por alusão à cor das janelas, que pela primeira vez apareciam verdes na pequena cidade. Verdade que antes a casa tinha as paredes rosas e as janelas verdes, em homenagem a certa escola de samba, mas os cidadãos começaram a chamar a casa de Casa Rosinha, ao invés de Casa Rosada, como pretendia o prefeito, e foi decidido pintar as paredes de branco e adotar oficialmente o nome de Casa Verde. Se primeiro na Casa foram trancados homens que dormiam com outros homens, mulheres que dormiam com outras mulheres e casais que dormiam com outros casais – a maioria denunciados por vizinhas do andar de baixo –, a partir da nova demanda do prefeito qualquer homem com brincos nas duas orelhas, sobrancelhas aparadas ou unhas feitas corria sério risco de ser alienado. Também meninas de cabelo curto e corpo musculoso, senhoras com voz grossa e porte avantajado ou mulheres de quarenta anos ou mais reconhecidamente belas e solteiras eram invariavelmente levadas à Casa e submetidas a rigoroso tratamento científico. Ao cabo de cinco meses estavam alojadas umas cento e oitenta pessoas na Casa; mas Simão Brutamontes não afrouxava, ia de rua em rua, de casa em casa, espreitando, interrogando, estudando; e quando colhia um enfermo, levava-o (ou levava-a) com a mesma alegria que outrora os arrebanhava às dúzias.
Considerava seu trabalho concluído quando foi ao gabinete da prefeitura novamente. Entrou no gabinete sem pedir licença, pôs os pés em cima do sofá e o prefeito, sem esperar a pergunta, disse:
– Não adiantou. Ontem foram três horas. Três horas de conversinha com outro homem, sabe o que é isso?, os dois balançaram a cabeça, coçaram a barba, e o prefeito continuou: – Pelo menos eu descobri quem estava do outro lado da linha.
Foi duro ouvir aquele nome. O doutor tossiu, pediu para o prefeito repetir e, quando não restava dúvidas sobre o dono da voz grossa do outro lado da linha, prometeu uma providência para aquele mesmo dia. Ou aquela mesma noite, quando se encontraria para a habitual rodada de canastra a dinheiro.
– Soares, olha que porcaria de jogada! Não sei por que insiste em vir jogar se não ganhas nunca, desafiou Simão.
– Ora, meu doutor, venho pela companhia dos amigos, é claro.
Não restava dúvida. O ativista apenas esperou a partida terminar para comunicar ao seu amigo Soares que teria de encaminhá-lo a Casa Verde. Discutiram e em meio a briga o vereador sai com essa:
– Não, não nego que falei com o filho do prefeito ontem à noite. Mas pode escrever, doutor, amanhã e depois de amanhã e depois de depois de amanhã outros vão ligar para ele e o senhor terá que trancar todos os homens da cidade naquela casa porque não há melhor papo que o filho do prefeito.
Simão não dormiu direito aquela noite nem as duas próximas. Instalara uma escuta na casa do prefeito e de fato sempre havia uma voz diferente conversando com seu filho, e pela manhã lá estava o doutor na casa dos donos das vozes para levá-los à Casa Verde. Deduziu que havia outras conversinhas deste feitio pela cidade e que elas logo se tornariam uma ameaça a decência, pulando do telefone para a cama, o que obrigou Simão a quintuplicar a capacidade de seu empreendimento.
Um caso em especial chocou a cidade e aumentou muitíssimo a importância do ativista. Cansado de monitorar as conversas do filho do prefeito, Doutor Simão achou por bem prender o próprio jovem, talvez fosse ele o culpado pelas recaídas masculinas. Chegou à hora do café na casa do prefeito, expôs seus motivos e pediu que o jovem o acompanhasse. Até aí tudo corria bem, o rapaz reagiu como se esperasse por aquilo, mas a primeira dama mal terminou de ouvir o diagnóstico do doutor e partiu para cima dele com as mãos cerradas, fazendo ecoar sua voz rouca e chorar seu marido, a esta altura encolhido numa poltrona.
– Não teve jeito, meu amigo, contou o ativista para o boticário no dia seguinte, quando vi tamanha inversão de papéis fui obrigado a levar a família toda para a Casa. Onde já se viu ela querer briga e ele chorar como criança?
A notícia da alienação do prefeito, sua esposa e seu filho apenas aumentaram a fama do doutor na pequena cidade. Seu telefone tocava sem parar com denúncia de irmãos contra irmãos, filhas contra pais, esposas contra maridos, colegas contra colegas, alunos contra professoras. E não bastasse o número assombroso de alienados, Simão era diariamente abordado por senhoras iradas dispostas a soqueá-lo em plena rua e senhores sensíveis chorando pelos seus filhos, pelos seus netos, pelas suas esposas ou pelos seus alunos. Naturalmente o doutor considerou aquilo muito estranho e aos poucos estes também tiveram de ser alienados. O boticário porque chorava a ausência do vereador, o vice-prefeito porque sentia falta do prefeito, a esposa deste porque lamentava o afastamento da primeira dama. Em pouco mais de meio ano, quatro quintos da cidade estava dentro da Casa.
Se o alvoroço dos internos era grande, a aflição do egrégio Simão Brutamontes é definida pelos cronistas da pequena cidade como uma das mais medonhas tempestades morais que têm desabado sobre o homem. Mas as tempestades só aterram os fracos; os fortes enrijam-se contra elas e fitam o trovão. Simão pensava em toda sua ciência e seu empreendimento enquanto embaralhava as cartas para uma partida sem apostas, sem conversas, sem companheiros. Olhou para os lados e sentiu falta da atenção do vendeiro, do sorriso fácil do vereador, da desconfiança do boticário. Lembrou do prefeito que confiara nele a sorte de tão proeminente cidade. E sentiu uma idéia que surgia encabulada sob seus sólidos preceitos morais.
Na manhã seguinte, para espanto geral, decretou que os internos da Casa Verde iam todos ser postos na rua.
– Todos?
– Todos.
– É impossível; alguns, sim, mas todos...
– Todos.
Por um dia a cidade voltou a sua rotina normal, à exceção do ativista que abria e fechava livros em busca de uma resposta. Passou o dia nessa pesquisa incessante até ser interrompido pelo boticário, pelo vendeiro e pelo vereador.
– Voltas ao carteado hoje, doutor?
A vontade era largar livros e estudos e abraçar demoradamente um por um dos amigos, talvez beijar-lhes a face, confessar a estima. Mas o ilustre ativista, com os olhos acessos da convicção científica, trancou os ouvidos, brandamente repeliu o trio e fechou-se para sempre no interior da Casa Verde, entregando-se ao estudo e à cura de si mesmo.
Outubro de 2006
(Publicado na Revista Arquipélago, do IEL/RS)

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Marcelo Spalding é formado em jornalismo e mestrando em Literatura Brasileira na UFRGS, vice-presidente da Associação Gaúcha de Escritores, editor do website Veredas, autor dos livros infanto-juvenis 'As cinco pontas de uma estrela' e 'Vencer em Ilhas Tortas', membro do grupo Casa Verde, colunista do Digestivo Cultural e participante de algumas antologias de contos. Profissionalmente dirige a msmidia.com, empresa de informática e comunicação há 5 anos no mercado. Em 2000 lança o livro As Cinco Pontas de uma Estrela, então com 17 anos.
http://www.marcelospalding.com/

domingo, 17 de agosto de 2008

Fornos carvoeiros (Silas Corrêa Leite)



Os fornos carvoeiros
Têm os seus guris pretos
Com os olhos fagueiros
Em toscos comequietos
Sempre uns serviceiros
Se tornando espectros
Os gabirus rueiros
E os seus tristes gestos
Os piás clandestinos
Dos fornos carvoeiros
Têm nos frágeis meninos
Coitados, de trigueiros
Humildes com destinos
Em cruzes sem luzeiros
E são como caprinos
Nesses vis pardieiros
Os clandestinos fornos
Têm os moleques pretos
Na pele os contornos
Com fuligem em espectros
De exploradores donos
Morrem magros, infectos
Assim, em abandonos
Nem terão filhos ou netos
Meninos carvoeiros
Que sustentam seus pais
Pobretões e cordeiros
Desses guetos gerais
Passam dias inteiros
Transportando, em pás
Tantos carvões vermelhos
Que a morte lhes traz
..............................
Os patrões vivaldinos
Desses escravos pretos
São de grandes domínios
E têm lucros certos
(Os curumins, franzinos
Quais gravetos – espectros
NOS FORNOS CLANDESTINOS
SIMPLESMENTE SECAM)

De Itararé-SPE-mail: poesilas@terra.com.brwww.itarare.com.br/silas.htm
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quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Notas poéticas: Pietà de Dante Milano (Henrique Marques Samyn)

(Dante Milano)


Pietà, de Dante Milano

Essa Mulher causa piedade
Com o filho morto no regaço
Como se ainda o embalasse.
Não ergue os olhos para o céu
À espera de algum milagre,
Mas baixa as pálpebras pesadas
Sobre o adorado cadáver
.Ressuscitá-lo ela não pode,
Ressuscitá-lo ela não sabe.
Curva-se toda sobre o filho
Para no seio guardá-lo,
Apertando-o contra o ventre
Com dor maior que a do parto.
Mãe, de Dor te vejo grávida,
Oh, mãe do filho morto!
Em 1987, Carlos Drummond de Andrade referiu-se, em uma entrevista, a um “grandíssimo poeta”, “de extraordinária qualidade” que ninguém conhecia, embora tivesse “quase noventa anos”. Quase vinte anos depois, Dante Milano – este grandíssimo poeta – continua pouquíssimo conhecido, embora a recente publicação de sua Obra reunida (Academia Brasileira de Letras, 2004) dê uma nova chance, aos leitores da melhor poesia, de conhecer a esplêndida obra milaniana.
Poeta de precisão clássica e de lucidez implacável, muitas vezes agônica, Dante Milano construiu uma obra de solidez exemplar, erigida sobre a tríplice base da morte, do amor e do sonho, como analisou Ivan Junqueira em seu atinado ensaio sobre a obra milaniana (Dante Milano: o pensamento emocionado). Uma poesia sempre avessa a quaisquer concessões ao trivial ou ao vulgar, capaz de desvelar, em meio à marginalidade mais brutal – os bêbados, mendigos e vagabundos que vez por outra despontam em seus versos – , a imponderável dignidade das criaturas que acolhem, fiéis, o peso da existência dolorosa, mesmo sabendo-se incapazes de sustentá-lo; a dignidade, enfim, dos que caminham por “Essa rua cuspida / E por todos pisada, / Que é a verdadeira estrada / Por onde passa a vida”.
Em Pietà, o olhar milaniano debruça-se sobre o tema da morte crística, motivo que levou à criação de algumas das mais belas obras de arte de todos os tempos; basta pensar na escultura de Michelangelo ou nas pinturas de Bellini ou El Greco. Dante Milano concentra-se na experiência psicológica da mãe que tem, entre os braços, o filho morto, opção já ressaltada nos três primeiros versos da composição: “Essa Mulher causa piedade / Com o filho morto no regaço / Como se ainda o embalasse”. A inicial maiúscula em “Mulher”, note-se bem, aponta para uma dupla direção: de um lado, para a condição superior de Maria, mulher eleita por Deus, consoante uma perspectiva cristã; de outro lado, segundo uma visão mais alegórica, para a percepção daquela mulher como sendo, na verdade, uma representação de todas as mulheres – leitura sem dúvida pertinente, uma vez que o poema trata da desolação perante a perda definitiva de um ente querido; experiência, portanto, intrinsecamente humana.
A centralidade da dor é ressaltada, no poema, tanto por sua dimensão descritiva – a mãe que “Não ergue os olhos para o céu / À espera de algum milagre”; que se curva sobre o cadáver e, tomada pela dor, aperta-o contra o ventre – quanto por sua dimensão formal; no tocante a esta, à guisa de exemplo, note-se a belíssima passagem do verso “À espera de algum milagre” para “Mas baixa as pálpebras pesadas”: no primeiro, a acentuação destaca consoantes foneticamente oclusivas (p, g), fechando o verso uma constritiva (l), além de uma alternância de vogais abertas e fechadas (e, u, a), o que sugere uma situação de incerteza e expectativa, tanto por conta da respiração exigida pelas oclusivas, algo aliviada no final pela presença da constritiva, quanto por conta da já mencionada inconstância da sonoridade vocálica; já no segundo verso, note-se o destaque concedido pela acentuação à vogal a, gerando uma continuidade sonora que não se fazia presente no verso anterior, além da forte repetição das oclusivas bilabiais p e b, o que altera o sentido da expectação: esta sonoridade, associada à dimensão semântica do verso, intensifica a idéia de pesar e dissolução da esperança sugerida no verso anterior, tanto por conta da força da coliteração quanto por conta da monotonia fonética das vogais. Nos versos finais, Dante Milano abandona a atitude descritiva para assumir a atitude empática que já fora sugerida no verso inicial, de modo a fechar o poema ressaltando sua humanidade; a repetição do termo “Mãe” em momentos capitais dos versos – abrindo o ritmo trocaico do penúltimo verso e o iâmbico do verso final – intensifica a afetividade desta relação com a padecente mulher.
A Pietà milaniana é, enfim, um poema que trata, de modo singular, da dor – não da dor de uma santa, mas da dor de uma mulher; vivência que, radicalizada, torna-se uma suprema representação de uma experiência humana, demasiado humana.
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domingo, 10 de agosto de 2008

Sobrosso (Clauder Arcanjo)





















Ninguém me falou nada. Apenas imaginei tudo. Pelos olhos, pelas sobrancelhas arqueadas de todos ao entrarem. Minha mãe, coitada, parecia em pânico. O vestido escuro e as orelhas deabano mais se lhe ressaltavam o estado de temor. Meu pai, já dentro dos setenta, carregava nas costas o medo vetusto. Sem grandes esgares, sem maiores rompantes, mas tudo muito sólido, cristalino, presente em cada ruga do seu rosto. No entanto, Josefina Maria, nossa empregada, segunda mãe de todos nós, esta, pela mãe de Deus!, era um pote de pavor. Daqueles transbordantes. Digo pelas mãos trêmulas, pelos lábios roxos presos aos dentes, pela cabeça inquieta, nervosa, como se em busca de algo. Entraram e sentaram; ninguém dava por mim. De repente, levantaram-se, e passaram, em passos pesados, rumo aos quartos. Cabisbaixos, macambúzios, desligados do tempo, como se com as mentes a léguas. Na certa, presos na casa de Alzira, da pequena Alzira, afilhada dos meus pais. A morte prematura da prima pusera um receio incomum em cada canto da nossa morada; e, naquela noite, eu dormi sozinho, a sonhar com fantasmas. Ao acordar, a cidade ainda dormia, e pude perceber que urinara na rede, como há anos não o fazia. O sobrosso levara-me de volta à infância, em passos céleres, e numa longa mijada, naturalmente.

clauder@pedagogiadagestao.com.br
Publicado no jornal Gazeta do Oeste (Mossoró-RN), caderno Expressão, espaço Questão de Prosa, edição de 3 de agosto de 2008.
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terça-feira, 5 de agosto de 2008

O retorno (Belvedere Bruno)


















Aguardava, mais uma vez, seu retorno. Sabia que, num dado momento, ouviria sua voz, a princípio, fingindo indignação para, aos poucos, amaciar, tocando de mansinho todo meu ser. Por meses, acalentei o desejo do reencontro, mas me afligia o passar dos dias. Seria um teste para meus limites? Nada havia ocorrido fora do normal, em se tratando de brigas de casais. As mesmíssimas discussões, por vezes tolas e sem sentido. Fato corriqueiro nesses quinze anos de relacionamento. Ela voltaria. Claro que sim! Estava cheio de certezas, mas, mesmo assim, decidi procurá-la. Sim, eu nunca tivera orgulho, pois meu amor ultrapassava quaisquer barreiras imaginárias.Tracei estratégias e, embora mantendo a esperança, sentia que alguma coisa estava fora dos eixos. Não sabia exatamente o que. Como era difícil viver sem sua presença! Era como se fosse parte de mim. Por onde ela andaria?
Sentado à mesa de um bar, cercado por amigos e alheio à conversa ao redor, eu olhava para o vazio, refletindo sobre os descaminhos da vida, quando, subitamente, alguém me tirou daquele estado. Era ela, sentada sozinha a uma das mesas. Aproximei-me, colocando as mãos sobre seus ombros e, com decisão, levantei meu rosto, como se perguntasse: "o que está havendo?" Poucos segundos bastaram para sentir que empreendia uma viagem que não me levaria a lugar nenhum. Um homem chegava, abraçando-a ternamente. Senti-me invisível. Ele parecia ocupar, de forma definitiva, aquele lugar, que hoje vejo, a despeito do tempo, nunca fora meu.Virei-me, sem que nenhum de nós pronunciasse palavra, mas seu semblante, ao lado daquele homem, resplandecia, como nunca havia visto no decorrer de nossos dias... Senti o baque e, com ele, a doída e nunca pressentida certeza do nunca mais.
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domingo, 3 de agosto de 2008

Dia suspenso (Aldemar Norek)



estende o hálito da tarde sobre mim
dia suspenso
dia que perdi num lapso branco revestido por vermelhos avos
e emergido assim da treva em cores de marfim


há lápides no ar
extensos ritos sons dispersas iras
tal cravos de arlequim
e sorriso nenhum sossego
pânico nenhum
só me espargiu o travo desse dia resgatado ao desterro


não ir é o meu caminho
e a nula urgência e a falta de motivos
formam pacto comigo
quando este dia elimina
rosto abrigo treva tempo
sentido.
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sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Cinco séculos de poesia brasileira (Adelto Gonçalves)




I
Os professores de Literatura Brasileira tanto do ensino médio como do ensino universitário já não precisam de se preocupar tanto para elaborar os seus planos de ensino nem consultar uma grande quantidade de livros nem sempre disponíveis nas bibliotecas de escolas ou mesmo de universidades públicas ou privadas. Foi pensando nisso que a Companhia Editora Nacional e a Lazuli Editora decidiram editar uma série de cinco livros sobre a poesia brasileira desde a formação do País até o começo do século XX, entregando a tarefa a uma equipa de jovens críticos e professores já com experiência em sala de aula, todos ligados à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O resultado é uma edição que merece toda a confiança do leitor e que permite "pensar a história da poesia no Brasil e suas principais linhas de força, ao longo de cinco séculos", como assinala na apresentação do primeiro dos cinco volumes Paulo Franchetti, professor titular de Teoria Literária na Unicamp, responsável também pela apresentação dos demais livros.O primeiro volume da série, Antologia da poesia barroca brasileira, traz poemas de Gregório de Matos (1636-1696), Bento Teixeira (c.1561-1600), Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711) e Sebastião da Rocha Pita (1660-1738), seleccionados por Emerson Tin, doutorando em Literatura Brasileira pela Unicamp, responsável também pelo prefácio, por notas explicativas e de natureza literária, contextual e lexical e por uma pequena notícia biográfica de cada autor que ajudam a tornar cada poema mais legível ao leitor pouco versado na produção barroca luso-brasileira.Não é preciso dizer que na produção poética do período a primazia é de Gregório de Matos, o que levou o organizador da antologia a seleccionar 40 dos seus poemas. O seu contemporâneo Botelho de Oliveira aparece com 20 poemas, enquanto Rocha Pita, consagrado autor da História da América portuguesa, tem resgatada a sua um tanto esquecida produção na Academia Brasílica dos Esquecidos. Quem, porém, abre a antologia é Bento Teixeira, conhecido especialmente pelo poema épico "Prosopopéia", que tem como modelo "Os Lusíadas", de Luís de Camões (1524?-1580).
II
Com selecção e notas de Pablo Simpson, o segundo volume da série, Antologia da poesia árcade brasileira, dedica os maiores espaços, como não poderia deixar de ser, a Cláudio Manuel da Costa (1729-1789) e Tomás António Gonzaga (1744-1810), mas também contempla parte da produção de Santa Rita Durão (1822?-1784), Domingos Caldas Barbosa (1738-1800), Basílio da Gama (1741-1795), Alvarenga Peixoto (1744-1793) e Silva Alvarenga (1749-1814). Reúne o que de melhor produziu a poesia árcade e, de certo modo, ajuda-a a recuperar um lugar que nem sempre lhe foi reconhecido pela crítica, especialmente a da primeira metade do século XX, que viu com prevenção a estilização e o apego dos seus poetas a cânones não só portugueses como italianos, esquecendo-se de que, à época, o Brasil não existia como nação organizada e, na verdade, éramos todos portugueses. Como assinala Paulo Franchetti na apresentação, o Arcadismo, embora não tenha recebido a fortuna crítica e a recepção entusiasmada com que o Barroco tem sido contemplado nos últimos anos, já pode ser visto de modo mais favorável. Além disso, o próprio movimento de constituição de agremiações intelectuais, as famosas academias, diz o professor, "parece mais simpático, quando se considera que o uso dos pseudónimos e a valorização do talento como único requisito para admissão dos membros encenavam, na sociedade estratificada do século XVIII, o ideal de uma aristocracia de espírito e não de sangue". Para isso, muito contribuíram os recentes estudos de Jorge Ruedas de la Serna, Vania Pinheiro Chaves, Ivan Teixeira, Alcir Pécora, Melânia Silva de Aguiar, Sérgio Alcides, Ronald Polito, Joaci Pereira Furtado, José Ramos Tinhorão, Luís André Nepomuceno e, se permitem a pouca modéstia, a biografia de Tomás António Gonzaga que este articulista escreveu.
III
Antologia da poesia romântica brasileira, com selecção e notas de Pablo Simpson, Pedro Marques e Cristiane Escolastico Siniscalchi, é um volume mais encorpado, em razão mesmo da necessidade de abranger maior número de autores. O período, a rigor, vai de 1836, quando o poeta Gonçalves de Magalhães (1811-1882) publicou um ensaio na revista Niterói, editada em Paris, lançando as ideias de um programa para a edificação de uma literatura genuinamente brasileira, sob a influência da natureza americana, até meados da segunda metade do século XIX. E configura a presença do Romantismo em terras brasileiras. Além do citado Gonçalves de Magalhães, o volume abrange autores díspares como Sousândrade (1832-1902), autor de "O Guesa Errante", poema redescoberto pelos concretistas Augusto e Haroldo de Campos (1929-2003) a partir da década de 60 do século passado, e Gonçalves Dias (1823-1864), autor da antológica "Canção do exílio" e de alguns dos mais importantes poemas da lírica indianista brasileira. Reúne ainda Luís Gama (1830-1882), com suas sátiras aos comportamentos, tipos e situações de sua época, Bernardo Guimarães (1825-1884), com a sua poesia erótica e, às vezes, até pornográfica, Álvares de Azevedo (1831-1952), com a sua fina e sepulcral poesia, Laurindo Rabelo (1826-1864), com a sua poesia satírica e fescenina, Casimiro de Abreu (1839-1860), com a sua lírica de tons suaves, Castro Alves (1847-1871), com os seus versos grandiloquentes em favor dos escravos, Fagundes Varela (1841-1875), com os seus poemas religiosos uns, amorosos outros, de inspiração regional ou sertaneja, Juvenal Galeno (1836-1931), com os seus versos francamente populares, e Junqueira Freire (1832-1855), com os seus poemas de monge atormentado.
IV
Com selecção e notas de Pedro Marques, Antologia da poesia parnasiana brasileira apresenta poemas de 14 poetas, entre consagrados e outros menos conhecidos do grande público, mas não menos representativos do parnasianismo. Entre os consagrados, estão Olavo Bilac (1865-1918) e Machado de Assis (1839-1908), cuja produção como poeta acabou abafada pelo êxito dos seus romances da última fase. Entre os menos afamados, estão Luís Delfino (1834-1910), B. Lopes (1859-1916) e Francisca Júlia (1870-1920), a única mulher entre os poetas reunidos. Lembra Franchetti na apresentação que o parnasianismo, em seu grande momento, ocupou lugar proeminente em jornais, revistas, conferências públicas e saraus burgueses, atraindo grande público para a poesia, o que, aliás, nunca haveria de se repetir, guardadas as devidas proporções no tempo. É de ressaltar ainda que, desde os primeiros tempos do Brasil independente, a literatura esteve comprometida com as questões vitais da nação, tendo assumido a bandeira da causa abolicionista.Encerrada a questão da abolição da escravatura – embora a situação dos ex-escravos nunca tenha efectivamente preocupado o governo e as classes dirigentes –, e estabelecida a República, desapareceram os grandes temas épicos. Assim, a poesia refluiu a um exclusivo cultivo artístico, calcado em movimentos europeus posteriores ao Romantismo. Embora fique clara a influência do movimento francês, os parnasianos brasileiros procuraram um caminho próprio, o que explica o fato de terem caído no gosto da população ou pelo menos daquele público letrado que se interessava pelas coisas do espírito. Com certeza, tal foi a importância do lugar que essa geração ocupou na sociedade de seu tempo que a ela se deve a criação da Academia Brasileira de Letras, como lembra Pedro Marques na sua introdução.Se muitas vezes os modernistas atacaram sem medidas o parnasianismo, isso se deu por conta da necessidade que tinham de oferecer alternativas para o que consideravam fórmulas gastas dos parnasianos. Mas nunca deixaram de reconhecer a importância histórica do movimento.
V
Com selecção e notas da professora Francine Ricieri, doutora em Teoria e História Literária na área de Literatura Brasileira pela Unicamp, Antologia da poesia simbolista e decadente brasileira reúne nove poetas de um movimento que, ao não alcançar a repercussão do parnasianismo, agrupa nomes ainda pouco conhecidos do público. Diz a organizadora em aprofundado estudo introdutório à guisa de prefácio que esses poetas, como jamais pretenderam servir à causa nacional, "foram usualmente representados como alienados, desenraizados, fúteis, irracionalistas, incompreensíveis, colonizados". Seja como for, como observa Franchetti na apresentação, a poesia simbolista reserva muitas surpresas "e a leitura desta antologia por certo ajudará a reverter a ideia de desinteresse que se colou à produção simbolista". Para que esta frase não fique aqui assim um tanto solta, é de lembrar que Franchetti, autor de As aves que aqui gorjeiam - a poesia do Romantismo ao Simbolismo (Lisboa, Cotovia, 2005), navega por estas águas com mão de mestre, como diria Massaud Moisés. Missal e Broquéis, publicados no Rio de Janeiro em 1893, por Cruz e Sousa (1861-1898), teriam sido a primeira manifestação em livro no Brasil do Simbolismo ou Decadentismo. Por isso, além de peças de Cruz e Sousa, que abrem o volume, a organizadora recolheu poemas de Alphonsus de Guimaraens (1870-1921), B. Lopes (1859-1916), Eduardo Guimaraens (1892-1928), Maranhão Sobrinho (1879-1915), Pedro Kilkerry (1885-1917), Da Costa e Silva (1885-1950), Emiliano Perneta (1866-1921) e Alceu Wamosy (1895-1923). É de notar que B. Lopes aparece aqui também porque sua poesia tanto tem traços parnasianos como simbolistas. Desses, o mais visível nos dias de hoje é Da Costa e Silva, em razão do trabalho de resgate de sua poesia encetado por seu filho, o poeta Alberto da Costa e Silva, ex-presidente da Academia Brasileira de Letras, que tratou de republicar a produção do pai, embora Alphonsus de Guimaraens e Emiliano Perneta também sejam frequentemente lembrados em estudos académicos. Outro bem conhecido seria Augusto dos Anjos (1884-1914), cuja poesia apresenta recursos e temas relacionados à poesia simbolista, mas a organizadora preferiu deixá-lo de fora da antologia, argumentando que incluí-lo seria fornecer do poeta "uma visão que não condiz com a linha peculiar e tão característica em que sua poesia se definiu". Até porque a produção de Augusto dos Anjos guarda igualmente traços parnasianos e até mesmo pré-modernistas. Por isso, seria aceitável que alguns especialistas viessem a questionar a sua exclusão, mas a verdade é que o estudo introdutório de Francine Ricieri é tão bem embasado e didático e as suas extensas notas de leitura tão esclarecedoras que essa se torna uma tarefa extremamente difícil e ingrata.
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