(Quadro de Chico Lopes)
Eu quero a poesia concretamente não concreta!?
Um poema não poético não hermético não soneto nem só Netto
Um poema-cuspo na hipocrisia de quem se diz poesia
Sem acordo sem sintaxe nem metro ou morfologia
O meu poema tem de ser vazio da cabeça aos pés
Sem Nossa Senhora sem cachoeiras sem badalos de sinos sem amores fieis
Eu quero um poema que não seja truque nem mágico nem mágica
Que não seja verso nem falso nem farsa
Que chegue a Lém da poeticidade convencional conveniente convexa e com cavas
Que vá como se vás o poeta às favas
Que se escreva com avaro o amor amaro ocre e acre
Com porrada o susto o massacre
Quero a poesia sem sobras sem prantos sem lábios tremulantes
Sem lágrimas lenços brancos sem berço sem fim nem meio
Sem bundas sem coxas olhos ou seios
Um poema que não seja desta terra nem do céu menos da lua
Que não escorregue lânguido entre os poros da pele nua
A poesia sem rima sem ramos sem remos... cem rumos
Eu quero o poema que não seja emo nem poemo
Eu quero paixão que não seja calor
Nem ouro nem prata o meu poema tem de ser de lata
O poema é e tem de ser sempre o perdedor
Decepcionado, decepado e vergastado pela dor
Eu quero quentura que não seja fritura — não quero tristeza eu quero é tristura
Constringe-me a mente a sinérese da minhagonia
De não a querer mais e mais podê-la poema que poesia.
Eu quero a poesia com Creta à mente?!
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