(Bar do Gomes, J. Victtor)
Em uma roda de barzinho, dificilmente se encontra um homem sóbrio ou uma mulher que não se faça de bêbada.
Engolidos por tanto barulho e premidos por mesinhas em calçadas estreitas, amigas e amigos bebiam sem pressa a vaguear em temas diversos. Os homens, todos escritores, se não em futebóis, traziam a literatura, permitidas as digressões sobre a vida alheia. As mulheres, nenhuma escritora, quando não puxavam por sapatos, acessórios ou o filme do momento, enveredavam serenas pela seara, acreditem, do sexo.
No “Mundo Fêmeo” em que vivemos, os homens mantêm as formas tradicionais e historicamente falidas de praticar a sua extra-sexualidade — prática esta cuja cena final é a mala de roupas lançada pela esposa ao vento, onde se vê, de fora, a manga da camisa preferida acenando adeus para a ex-amada, cansada de fingir não ver as suas manias —, ao contrário, as mulheres, sensíveis e imaginosas, todos os dias renovam conceitos e os reinventam, a exercitá-los, como um comerciante, com um misto de atuação e de racionalidade.
Dentre os debates (embates?), minhas amigas esfregaram na cara, para o pasmo masculino, a figura antes desconhecida do famigerado “P.A.”. Mas o que seria tal coisa? Pois bem, o P.A. (“pênis amigo”) é o correspondente à amante masculina, a ímpia inimiga mortal da família, da moral e dos bons costumes e destruidora de lares (por vezes, já em cacos). Curiosamente, todo esse peso clássico atribuído à colega de gênero, não é outorgado ao seu igual do gênero oposto, tratado, aliás, com a mais sincera naturalidade. Assim, enquanto elas não perdoam as nossas amantes (“nossas”, modo de dizer), principalmente quando estas são-lhe jovens e magras, os seus, elas vêem como um “brinquedo”, assegurando, sem tremer-lhes a face, não ter nenhuma importância, pois usam-no apenis, digo, apenas, e afirmam, como condição essencial de uso, não ter sequer uma admiraçãozinha pela criatura que, após satisfeito o desejo — meramente físico, claro —, o enxotam como um cão (que somos). Pior: o infeliz ainda sai a sorrir, se achando, a perguntar se pode ligar de novo, carregando com ele, e dentro das calças, quiçá, o único motivo de orgulho.
Não estivéssemos suficientemente humilhados, decidiram elas fazer uma análise — precipitada, obviamente... — sobre a qualidade dos amantes letrados. E seguiram assim: O contista, um minimalista por gênero, seria um precoce. Isso, advertem, nada tem a ver com prodigiosa inteligência, mas com a surpreendente habilidade de dar por encerrada a “reunião” sem aviso prévio, e quando esta, ao menos, começou. O poeta seria aquele que se saía melhor na fama do que na cama. Dizem que ama as mulheres, todas elas, mas na hora do vamos ver, fica somente a dever, e, se duvidar, corre do batente, de súbito, a buscar no quarto algum resto de papel, um guardanapo que seja, para escrever, com os olhos marejados e a voz doce, a rima adequada: tocha, rocha, galocha... O romancista seria aquele que não resolve nem sai de cima, mesmo quando não se está acontecendo nada. Ele persevera, enrola, vai aqui e acolá e parece não ter pressa de chegar aos finalmentes. Uns, irritantes, segundo elas, têm o hábito de falar demais e terminar sempre com “... sabia?” Claro que elas sabem, mas não querem saber e terminam não sabendo mesmo! O ensaísta, o nome já diz tudo, muito sem jeito, perde-se em lucubrações desnecessárias, sendo capaz de passar a noite inteira a discorrer sobre o Kama Sutra — se duvidar em sânscrito —, alongando-se pela cultura védica e hindu até entupir-se em uísque e tombar em autogozo à cama, pegando na mão da entediada amante não amada, a dizer: “ah, que noite! que noite!” O cronista, disseram, por sua simplicidade, por não ter pressa e se ocupar de detalhes que geralmente os demais relevam, parecia-lhes o eleito “amante ideal”, o que nos aliviou da vergonha de final de noite e do incômodo indisfarçado de meus malamantes amigos, a quem dedico carinhosamente esta... CRÔNICA (graças a Deus)!
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