“Lagartas-de-Vidro” é o livro de contos que o escritor Raymundo Silveira apresenta ao leitor. O trabalho foi ganhador do Prêmio Concurso Nacional de Conto e Poesia – Correio das Artes 60 anos, da Paraíba. A orelha do livro vem assinada pela escritora Maria Valéria Rezende e a arte da capa é de Lia Silveira. É a segunda obra literária premiada do autor sobralense membro da SOBRAMES (Sociedade Brasileira de Médicos Escritores). A publicação reúnde 27 contos e o primeiro deles dá nome à coletânea.
Depois que nos apresentou suas crônicas no livro “Louca Uma Ova”, Raymundo Silveira, neste novo trabalho, só vem confirmar seu fôlego de escritor, agora no gênero literário que consagrou mestres como Machado de Assis e tantos outros mundo afora. Em seus contos, a ficção e a realidade comunicam livremente, numa simbiose que tão-só beneficia a grandeza de imaginação. Em alguns desses escritos tem-se a impressão de que o autor está falando de si mesmo, porém, um conteúdo alegórico logo desfaz essa impressão, como no enredo do conto “Luzes do Destino”, ao qual ele dá inclusive um toque de realismo fantástico.
A variabilidade de temas explorados por Raymundo Silveira favorece história para todos os gostos. O requinte da vida urbana está bem presente em suas narrativas, mas não ficam de fora aspectos interessantes da vivência do homem sertanejo. Exemplo claro é o conto “Exorcismo”, costurado numa linguagem prodigiosamente coloquial. “Sabença de livro seu doutor, sabença não é. E se é, de nada serve. Veja o senhor eu não me troco por menino novo filho de coronel.” Assim começa o conto, entremeado de expressões populares, e que ainda nos fala de mandinga, simpatias, superstição, mezinhas e reza para espantar maus espíritos, como esta: “Do tutano deu no osso, / do osso deu no nervo, / do nervo deu na carne, / da carne deu na pele, / da pele foi parar nas ondas do mar”.
A dimensão dos contos de Raymundo Silveira atinge o ápice que requer o assunto. Não importa o tamanho do texto, haja vista que há narrativas com maior extensão e outras que se resumem a um diálogo, como é o caso de “Desculpa”. E nada está fora de moda na sua temática, pois, como já foi dito, há uma espécie de comunhão geral e benigna entre o antigo e o moderno, entre o refinado e o usual, num ambiente multiforme por excelência. Tudo isso manifesto em termos e expressões de inequívoco poder literário. Há evocação de amores, reminiscências pueris, drama, esplendor, medo, coragem, revés e vitória, dor e alegria no repertório de contos de Raymundo Silveira. Ou seja, os vários matizes que dão vigor a uma boa obra literária.
O ultramoderno também está presente em seus contos, como neste intitulado “Self-Service”, em que o personagem denominado 7XY001 papeia com amigas num cybercafé. “Ué, você andou ganhando peso ou a sua Cam está distorcento imagens?” É a lingagem de vanguarda dos internautas ganhando espaço na literatura. Outro alvo dos contos de Silveira é a virilidade, tão energizada nos últimos tempos pelos milagrosos fármacos. O assunto é tratado com um realismo inflamado em “O suado milagre”, no qual a indispensável dose de ironia dá andamento a uma narrativa tanto excitante quanto conveniente ao tema.
Com seus dois livros premiados e mais um que chegará em breve – “Medicina Crônica” – Raymundo Silveira está vitaminando as nossas letras com um ótimo trabalho que vem sendo oportunamente reconhecido nos meios literários do Ceará e fora do Estado. Como médico, tem vários trabalhos publicados em revistas e livros do gênero. Mas ele não esconde que sua atividade literária ganhou mesmo força com o advento da internet. O sucesso do livro, por sinal, é bem notado nos comentários dos leitores publicados na web. Aguardamos agora “Medicina Crônica”.
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