O
Homem que Calculava (de Malba Tahan) e Mênon (de Platão) são livros que
consagram raciocínios absurdos de resultados aparentemente corretos. A
diferença é que a engenhosa brincadeira do primeiro, é engenhoso engodo pra nos
convencer da imortalidade da alma, do segundo. Malba conta que seu protagonista
viajava na garupa do camelo de um amigo, quando se interessou pela discussão de
três irmãos sobre como dividir os trinta e cinco camelos herdados do pai, de
modo que (conforme o testamento) o mais velho ficasse com metade do lote, o do meio com um terço e o
caçula com um nono, o que seria impossível sem que alguns animais fossem
retalhados, pois os números obtidos não eram
inteiros. Esperto, nosso herói ofereceu a montaria que não era sua pra
arredondar as contas e imediatamente refez a partilha, agora com mágica
vantagem para todos, pois o primeiro, em lugar dos 17 e meio camelos ficou com
18;o segundo, que teria direito a 11 e um quebrado, ficou com 12; o terceiro,
que ficaria com 3 camelos e pouco, ficou com 4 e, como a soma 18 + 12 + 4 dá
34, sobraram dois animais, um dos quais voltou ao amigo que dera a carona, o
outro ficou pra ele. O segredo está no fato de que a soma de um meio, mais um
terço, mais um nono não dá um inteiro.
Aí
se deu que, quando eu lia os chamados Diálogos de Platão, tropecei no Mênon, em
que o velho Sócrates, pra provar que a maioria das coisas não as aprendemos,
mas as rememoramos de vidas passadas – processo chamado metempsicose – põe-se a
interrogar um escravo do personagem-título, ignorante em geometria, de modo
que, surpreendentemente, o homem parece revelar-se capaz de calcular o dobro da
área de um quadrado, “o que, evidentemente, ele já sabia de outra encarnação”.
Terminei de ler o livro estupefato, mas com um tremendo “não pode ser”
atravessado na mente. Reli imediatamente o diálogo e vi a mutreta: Sócrates, no
que desenhava a figura geométrica e fazia perguntas, dava – embutidas nelas –
as respostas. Veja, na parte essencial do livro: “Dize-me, rapaz: sabes o que é
um quadrado?” “Sei.” “Não é uma figura, como esta, de quatro lados iguais?”
“É.” “E estas linhas, que cortam o quadrado pelo meio, não são também iguais?”
“São.” “Esta figura poderia ser maior ou menor, não poderia?” “Poderia.” “Se,
pois, este lado mede dois pés e este também dois, quantos terá a superfície
deste quadrado? Repara bem: se isto for igual a dois pés e isso igual a um pé,
a superfície não terá de ser o resultado de uma vez dois pés?” “Terá.” “Mas
este lado mede também dois pés; portanto a superfície não é igual a duas vezes
dois pés?” “É.” “A superfície, por conseguinte mede duas vezes dois pés?”
“Mede.” “E quanto iguala duas vezes dois pés?” “Quatro.”
Claro que Sócrates e o Homem que
Calculava enrolavam Mênon e os cameleiros. Mas Platão quis também, de quebra,
nos enrolar.