Comecei a ler aos quatro, cinco
anos. Aos sete, aprendi a voar. O primeiro voo, nas asas de um condor,
desvendou as alturas da Cordilheira dos Andes, mais detidamente o chão do Chile
de Gabriela Mistral, de Pablo Neruda. (Meu pai, com sua pequena biblioteca
hispano-americana, possibilitou esse e outros voos.) Depois, naturalmente,
planei em céu nativo: Castro Alves, Cecília Meireles, Vinicius de Moraes, José
Lins do Rego, José Mauro de Vasconcelos. Ainda bem que a escola ensinava planos
de voo, e outras línguas. Machado, Drummond, Bandeira e alguns outros, só aos
treze, quatorze anos. O destino ainda era incerto. Mas já estava traçado o
caminho do vento.
Mas por que meus vizinhos precisavam
de tradução? Por que não escreviam no meu idioma? Não demorou, veio a
conscientização política e tudo se resolveu para o jovem aprendiz. Eram tempos
de busca, de procura e de muita curiosidade para uma adolescência inquieta e
ávida de sonhos. (O Atlântico podia ser imenso, largo e profundo, mas já havia
sido desvendado e não tinha mais segredos.) Assim, antes dos vinte, asas
crescidas, resolvi sair em busca de novas aventuras. E me fiz íntimo de Miguel
de Cervantes, Miguel de Unamuno, Federico García Lorca, Juan Ramón Jiménez,
Antonio Machado, Pedro Salinas... E da santa que também gostava de voar: Teresa
de Ávila.
Por isso, quando vejo uma pipa no
céu, lembro-me das páginas imorredouras que adejavam diante dos meus olhos. E
agradeço ao Destino a oportunidade de ter aprendido a conhecer novas e
distantes plagas da literatura universal. São poetas, contistas, novelistas,
almas aladas, com as quais aprendi a importância do voo e a dimensão da vida.
Da minha vida.
Hoje, pássaro feito, revejo o panorama das
letras ibero-americanas a estender-se soberano sob minhas asas renovadas. E do Parnaso me vêm os cânticos de outras
vozes poderosas a juntar-se, sob minhas penas, às reminiscências de um mundo
distante, porém sempre novo.
Brasília,
17 de setembro de 2013.