Tudo
transcorria na mais perfeita paz. Na sala, Veridiana lia o livro Mistério de
Marie Roget, do grande escritor Edgar Allan Poe.
O enigmático livro tem por base um fato verídico ocorrido
em 1841, nos arredores de Nova York, com o aparecimento do corpo da jovem Marie
Roget.
Poe
acabou ficcionando e ambientando a trama da história na cidade de Paris.
Veridiana,
muito empolgada, degustava cada palavra, linha ou parágrafo, como se fosse a
última coisa a ser feita na vida. Lá fora, o tempo estava fechado. Uma ventania
soprava um ar aquecido e com ele o cheiro de terra.
Já era tarde, final de sábado. Ela estava sozinha.
Seu filho havia saído com amigos para uma festa.
Veridiana, empolgada com o livro, não tinha coragem
de parar de ler para atender ao telefone, que tocava insistentemente...
Não teve escolha, e acabou cedendo aos apelos do
aparelho, atendendo a contragosto.
— Alô!
— É da
casa da D. Veridiana?
— Sim.
Sou eu mesma. Do que se trata?
— Aqui é o inspetor Adalberto. Estou ligando da
delegacia para dizer que houve um acidente com seu filho André.
— Como é?
Acidente? Com o meu filho? Ele está bem?
— Por
favor, senhora, tenha calma! A senhora pode vir até a delegacia?
— Sim! Já
estou de saída.
— Okay!
Aguardo a senhora aqui na trigésima quinta D. P.
Veridiana, muito nervosa, ligou para o irmão e
marcou de encontrá-lo na delegacia.
Assim que
chegaram ao distrito policial, foram direto procurar o inspetor.
— Por
favor, estou procurando o inspetor de polícia
chamado Adalberto.
— Aguarde
só um minutinho, que irei chamá-lo.
Veridiana, não parava de esfregar as mãos. Fumava
um cigarro após o outro. O nervosismo era tanto que não conseguia ficar parada.
Andava de um canto a outro.
— Pois
não, sou o inspetor Adalberto.
— Por
favor, diga-me logo o que aconteceu com o meu filho?
— Tenha calma! Seu filho André sofreu um
capotamento perto do Rio Itabapoana, próximo à curva da ferradura. Seu corpo
foi encontrado às margens do rio, infelizmente sem vida.
— Não!
Meu filho, não!
Abraçada
ao irmão, Veridiana chorava copiosamente.
— Para
onde levaram o corpo do meu filho?
— Foi
levado para o necrotério de Itabapoana.
Saíram,
apressados, para a cidade vizinha.
Inesperadamente o telefone toca, e Veridiana acorda
assustada. O livro de Poe repousava aberto
sobre o seu peito.
Veridiana passa as mãos sobre o rosto e percebe que
tudo não havia passado de um grande pesadelo. Levantou-se do sofá, foi ao
banheiro, abriu a torneira, molhou o rosto ainda carregado pelo pesadelo e
sorriu!
“É, tudo não passou de uma brincadeira de
Edgar Allan Poe, comigo”.
/////